Exame - Portugal - Edição 452 (2021-12)

(Maropa) #1
DEZEMBRO 2021. EXAME. 79

sais, desde maiores dificuldades de financi-
amento para os Estados a um gigante balde
de água fria para a retoma.
Felizmente (ou não, dirão os críticos),
este pico nos preços surge numa altura em
que os bancos centrais são mais tolerantes
a estes avanços da inflação depois de anos
em que ela ficou muito abaixo da referên-
cia de 2%. Hoje, o BCE, por exemplo, tra-
balha com um objetivo simétrico. Isto é, 2%
continua a ser a referência, mas pode ficar
acima ou abaixo desse valor, classificando
como igualmente indesejáveis desvios aci-
ma ou abaixo dele. Ainda assim, devemos
esperar que a conhecida fobia alemã com a
inflação faça aumentar a pressão nos pró-
ximos meses.


O BALÃO BIDEN, UM XI JINPING DE PEDRA


Depois de um arranque ambicioso, o Presidente dos EUA começou
a perder gás, enquanto o Presidente chinês consolidou
o seu poder

> ATAQUE AO CAPITÓLIO

O ano arrancou com uma nuvem negra
sobre a democracia norte-americana,
quando apoiantes de Donald Trump inva-
diram o Congresso dos Estados Unidos da
América, em protesto contra a certificação
dos resultados eleitorais, que deram a
vitória a Joe Biden. Embora a condenação do
acontecimento tenha sido transversal, ele
serviu de marco para lançar dúvidas sobre
a legitimidade do escrutínio. Hoje, a maioria
dos republicanos acredita que a eleição foi
“roubada” a Trump, temendo-se uma ten-
tativa de boicote aos resultados em 2024.

> A AMBIÇÃO DE BIDEN

Joe Biden arrancou a sua presidência com
enorme ambição. O Presidente dos EUA
teve uns primeiros 100 dias especialmente
ativos, ordenando que os EUA voltassem a
integrar o Acordo de Paris para as altera-
ções climáticas, assim como a Organização
Mundial da Saúde. A nível interno, assinou
em março um plano de estímulo de quase
dois biliões de dólares. Poucas semanas
depois, Biden apresentava um plano de
mais de quatro biliões de investimento em
infraestruturas e apoios sociais. A vertente
de infraestruturas foi finalmente aprovada
em novembro, faltando saber o destino
da componente social e de combate às alte-
rações climáticas. Ainda assim, será muito
dinheiro a entrar na economia norte-a-
mericana nos próximos anos, com muito
mais ambição no apoio à retoma do que a
União Europeia. Ao mesmo tempo, apesar
de algumas decisões impopulares no palco
internacional (Afeganistão), a mudança de
Trump para Biden reabilitou o diálogo com
os parceiros habituais dos EUA, seja sobre o
tema do clima ou da saúde mundial. O acor-
do mundial para tributação de multinacio-
nais só foi possível devido ao compromisso
de Washington.

> A DESILUSÃO DE BIDEN

O estado de graça de Joe Biden durou pouco
tempo. As dificuldades em aprovar os seus
planos económicos (devido às divisões entre

moderados e progressistas no seu partido)
foram desgastando o líder norte-americano,
mas o golpe mais duro foi a desorganizada
retirada do Afeganistão. A sua popularidade
nunca voltou a ser positiva desde esse mo-
mento, com a sua avaliação a ser prejudica-
da ainda pela subida de preços, escassez de
mercadorias e uma nova vaga da pandemia
e estagnação da vacinação.

> CHINA GANHA INFLUÊNCIA
Pequim sai da pandemia com a sua posi-
ção económica mais solidificada enquanto
motor do mundo. Enquanto os EUA e a
Europa ainda estavam a lidar com ondas
cada vez maiores de coronavírus, a China já
estava a todo o vapor. Apesar de ter sido o
epicentro da crise pandémica, a economia
chinesa conseguiu evitar uma quebra do
PIB em 2020, tendo crescido mais de 2%.
Segundo as estimativas do FMI, terá cres-
cido 8% em 2021, antecipando um ritmo
acima de 5% até 2026. Se ajustarmos ao
poder de compra, a China já representa a
maior fatia do PIB mundial, tendo mudado
radicalmente a relação de forças com os
EUA. Na viragem do século, 20% do PIB
mundial vinha dos EUA e apenas 7% da
China. Hoje, o peso da China aumentou
para quase 19% e os EUA caíram para me-
nos de 16%. No final de 2020, assinou um
mega-acordo comercial pacífico-asiático,
que junta 15 países.

> XI JINPING COM MAIS PESO

2021 foi também o ano da consolidação
do poder do Presidente da China. A reso-
lução aprovada em novembro, que coloca
Xi Jinping no mesmo plano de importância
história que Mao Tsé-Tung, foi vista como
um sinal de ainda maior concentração de
poder. O seu pensamento político já tinha
sido integrado na Constituição do país em
2017 e foi abolido o limite de mandatos do
seu cargo. Internamente, sucedem-se as
queixas de violação de Direitos Humanos
no caso da comunidade uigur e não só.
Para o exterior, tem adotado uma postura
cada vez mais agressiva em relação a
Hong Kong e Taiwan.
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