Um lugar bem longe daqui

(Carla ScalaEjcveS) #1

estendeu a mão para ela: dedos compridos e bronzeados, palma aberta. Ela
hesitou; tocar em alguém significava abrir mão de parte de si, um pedaço que ela
nunca recuperava.
Mesmo assim, colocou de leve a mão dentro da dele. Ele a firmou enquanto
ela subia pela popa e se sentava no banco acolchoado. O dia estava quente e
ensolarado, e Kya, com uma calça jeans cortada e uma blusa branca de algodão —
traje copiado das outras —, parecia normal. Ele se sentou ao seu lado, e ela sentiu
a manga da roupa dele deslizar suavemente pelo seu braço.
Chase conduziu a lancha em direção ao oceano. O mar aberto fazia a
embarcação balançar mais do que o brejo tranquilo, e ela sabia que o movimento
de sobe e desce do mar faria o seu braço roçar no dele. A expectativa do contato
manteve seus olhos fixos à frente, mas ela não se afastou.
Por fim, uma onda maior do que as outras subiu e desceu, e o braço dele,
sólido e quente, acariciou o seu. Afastou-se, depois tornou a tocá-la a cada subida
e descida. E quando uma onda se ergueu sob a lancha, a coxa dele roçou na sua e
ela prendeu a respiração.
Conforme avançavam pela costa rumo ao sul, a lancha deles sendo a única
embarcação naquele lugar ermo, ele acelerou. Dez minutos depois, vários
quilômetros de praia branca se desdobravam paralelamente à linha d’água,
protegidos do restante do mundo por uma floresta arredondada e densa. Mais à
frente, Point Beach se abria feito um leque branco e brilhante.
Chase não tinha dito uma palavra desde que a cumprimentara; ela também não
dissera nada. Ele deslizou a lancha até a margem e colocou a cesta de piquenique
na areia, na sombra da embarcação.
— Quer andar? — perguntou.
— Quero.
Eles foram andando rente ao mar, cada ondinha cercando seus tornozelos com
pequenos redemoinhos e depois puxando seus pés ao voltar.
Ele não segurou sua mão, mas, de vez em quando, num movimento natural,
seus dedos roçavam. Às vezes se ajoelhavam para examinar uma concha ou um fio
de alga transparente e espiralado que parecia uma obra de arte. Os olhos azuis de
Chase eram brincalhões; ele sorria com facilidade. Tinha a pele muito bronzeada,
como a dela. Juntos os dois eram altos, elegantes, parecidos.
Kya sabia que Chase havia decidido não ir para a faculdade, mas trabalhar para
o pai. Ele era conhecido na cidade, o peru macho. E em algum lugar dentro de si
ela estava preocupada de ser também uma peça de arte da praia, uma curiosidade
que ele iria revirar nas mãos e depois jogar de volta na areia. Mas continuou
caminhando. Já tinha dado uma chance ao amor; agora queria apenas preencher
os espaços vazios. Aliviar a solidão enquanto erguia um muro em volta do
coração.
Depois de quase um quilômetro, ele se virou para ela e fez uma grande
mesura, abrindo o braço num convite exagerado para que se sentassem na areia
encostados num tronco trazido pelo mar. Enterraram os pés nos cristais brancos e
se recostaram.
Chase tirou uma gaita do bolso.

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