Um lugar bem longe daqui

(Carla ScalaEjcveS) #1

— Calma, calma. Está tudo bem.
Ela continuou deitada — cabelo espalhado na areia, rosto corado, boca
vermelha ligeiramente entreaberta —, linda. Com cuidado, ele estendeu a mão
para tocar seu rosto, mas, rápida como um gato, ela se desvencilhou e ficou em
pé.
Kya respirava com esforço. Na noite anterior, dançando na margem da lagoa,
ondulando com a lua e as efeméridas, imaginara estar pronta. Pensara que sabia
tudo sobre acasalamento por observar os pombos. Ninguém nunca tinha lhe
falado sobre sexo, e sua única experiência com preliminares fora com Tate. Mas
ela conhecia os detalhes por causa dos livros de biologia e tinha visto mais
criaturas copulando — e não só “esfregando os traseiros umas nas outras”, como
Jodie dissera — do que a maioria das pessoas jamais veria.
Só que aquilo era abrupto demais: um piquenique e depois acasalar com a
Menina do Brejo. Até os passarinhos machos cortejam um pouco as fêmeas,
exibindo penas brilhantes, construindo abrigos, dançando e cantando músicas
magníficas de amor. Sim, Chase havia trazido um banquete, mas ela valia mais do
que frango frito. E “Dixie” não chegava a ser uma canção de amor. Ela deveria
ter desconfiado que seria assim. O único momento em que os mamíferos machos
ficam por perto é quando estão querendo acasalar.
O silêncio foi aumentando enquanto eles se encaravam, interrompido apenas
pelo som da respiração deles e das ondas no mar. Chase sentou-se e estendeu a
mão para segurar o braço de Kya, mas ela se afastou com um puxão.
— Desculpa. Está tudo bem — disse ele, se levantando.
Era verdade, fora até ali transar com ela, ser o seu primeiro, mas observar
aqueles olhos incendiados o enfeitiçara.
Tornou a tentar:
— Por favor, Kya. Eu pedi desculpas. Vamos esquecer essa história. Vou levar
você de volta para seu barco.
Ao ouvir isso, ela lhe deu as costas e atravessou a areia em direção à mata. Seu
corpo comprido balançando.
— O que você está fazendo? Não dá para voltar a pé daqui. São quilômetros.
Mas ela já estava no meio das árvores e traçou uma linha reta, primeiro em
direção ao interior, depois atravessando a península para voltar até o barco. Não
conhecia aquela área, mas os melros a guiaram em direção ao brejo. Ela não parou
de correr nem nos charcos, nem nas valas, atravessou direto os córregos
espirrando água, pulou troncos.
Por fim, curvou-se e arfou, então caiu ajoelhada. Disse palavrões gastos.
Enquanto estivesse vociferando, os soluços não viriam à tona. Mas nada era capaz
de deter a vergonha ardente e toda aquela tristeza. A simples esperança de estar
com alguém, de ser de fato desejada, tocada, a atraíra. Mas aquelas mãos apressadas
e insistentes estavam apenas pegando, não compartilhando ou dando.
Ficou atenta a ruídos que pudessem ser ele vindo atrás dela, sem saber muito
bem se queria ou não que ele irrompesse pela vegetação e a abraçasse implorando
perdão. Isso a deixou com raiva outra vez. Então, exausta, ela se levantou e
percorreu o resto do caminho até seu barco.

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