Um lugar bem longe daqui

(Carla ScalaEjcveS) #1

convidar para o baile do Elks Club, mas sei como você é tímida, como nunca faz
nada na cidade. Sei que ia ficar muito infeliz. Você não conhece ninguém, não
tem as roupas certas. Sabe dançar, por acaso? Nenhuma dessas coisas tem a ver
com você. Você entende, né?
Olhando para o chão, ela falou:
— Entendo, e tudo isso é verdade. Mas, bom, eu preciso começar a me
encaixar em algumas partes da sua vida. A abrir minhas asas, como você falou.
Acho que preciso arrumar as roupas certas, conhecer alguns dos seus amigos. —
Ela levantou a cabeça. — Você pode me ensinar a dançar.
— Claro, ora, e eu vou ensinar. Mas fico pensando em você e eu, no que a
gente tem aqui. Amo o tempo que a gente passa junto, só você e eu. Para falar a
verdade, estou meio de saco cheio desses bailes bobos. É a mesma coisa todo ano.
No ginásio da escola. Velhos, jovens, todo mundo junto. A mesma música idiota.
Estou pronto para o próximo passo. Você sabe, quando a gente se casar não vai
fazer mesmo esse tipo de coisa, sabe, então para que arrastar você para lá agora?
Não faz o menor sentido. Está bem?
Kya voltou a olhar para o chão, então Chase ergueu de novo seu queixo e
fixou os olhos nos seus. Em seguida, com um largo sorriso, falou:
— E, cara, sobre o jantar de Natal com minha família, a tia velha coroca da
minha mãe vai vir da Flórida. Ela fala sem parar. Eu não desejaria isso para
ninguém. Principalmente para você. Acredite, você não está perdendo nada.
Ela permaneceu calada.
— Sério, Kya, eu quero que você fique numa boa com isso. O que a gente
tem aqui é a coisa mais especial que alguém poderia querer. Todas as outras
coisas... — Ele balançou as mãos no ar. — ... não passam de bobagens. — Ele
estendeu a mão e a puxou para seu colo, e ela apoiou a cabeça no seu ombro. —
O que vale é isto aqui, Kya. Não as outras coisas. — E lhe deu um beijo morno e
carinhoso. Então se levantou. — Ok. Tenho que ir.
Kya passou o Natal sozinha com as gaivotas, como havia feito todos os anos
desde que Ma fora embora.


*


Dois dias depois do Natal, Chase ainda não tinha voltado. Quebrando a promessa
que fez a si mesma de nunca mais esperar por ninguém, Kya ficou andando de um
lado para outro pela margem da lagoa, o cabelo preso numa trança embutida, a
boca pintada com o batom velho de Ma.
O brejo mais além estava coberto pela capa invernal de tons marrons e cinza.
Quilômetros de capim exausto vergavam a cabeça em direção à água, rendidos,
após terem dispersado suas sementes. O vento açoitava e rasgava, fazendo os
caules ásperos chacoalharem num coro ruidoso. Kya soltou o cabelo com força e
limpou a boca com as costas da mão.
Na manhã do quarto dia, estava sentada sozinha na cozinha, empurrando pão
de minuto e ovos de um lado para outro no prato.

Free download pdf