— Não, não. São só para mim. Eles me ajudam a aprender, só isso.
— Kya, me escute. Você sabe melhor do que ninguém que quase não existem
livros de referência sobre esta região aqui. Com estas anotações, estes dados
técnicos e estes desenhos esplêndidos, os livros que todo mundo estava esperando
estão aqui.
Era verdade. Os guias velhos de Ma sobre conchas, plantas, pássaros e
mamíferos da região tinham sido os únicos a serem impressos e eram de uma
imprecisão lamentável, apenas com ilustrações simples em preto e branco e
informações incompletas em cada verbete.
— Se eu puder levar algumas amostras vou me informar sobre um editor, ver
o que eles dizem.
Ela manteve o olhar fixo, sem saber o que pensar sobre aquilo. Será que
precisaria ir a algum lugar, conhecer gente? Tate notou a pergunta em seus olhos.
— Você não teria que sair de casa. Poderia mandar as amostras pelo correio
para a editora. Ganharia algum dinheiro. Provavelmente não muito, mas talvez
não precise passar o resto da vida catando mariscos.
Kya continuou sem dizer nada. Mais uma vez Tate a incentivava a cuidar de si
mesma, não apenas se oferecendo para cuidar dela. Parecia que ele estivera ali
durante toda a sua vida. Depois sumira.
— Dê uma chance, Kya. Que mal pode fazer?
Ela finalmente concordou em deixá-lo levar algumas amostras, e ele escolheu
uma série de aquarelas suaves retratando conchas e a garça-azul-grande por causa
dos detalhados desenhos da ave em cada uma das estações, além de um óleo
delicado representando a pena curva da sobrancelha.
Tate pegou o desenho a óleo da pena: uma profusão de centenas de pinceladas
finíssimas de cores vivas que culminavam num tom de preto fechado e tão
brilhante que o sol parecia estar tocando a tela. O detalhe de um rasguinho na
haste era tão nítido que tanto Tate quanto Kya se deram conta no mesmo instante
de que aquele desenho retratava a primeira pena que ele lhe dera de presente na
floresta. Tiraram os olhos da pena e se encararam. Ela desviou o olhar. Forçando-
se a não sentir. Não se deixaria atrair outra vez para alguém em quem não podia
confiar.
Ele se aproximou e tocou seu ombro. Tentou fazê-la se virar com delicadeza.
— Kya, eu sinto muito por ter deixado você. Por favor, não consegue me
perdoar?
Por fim, ela se virou e o encarou.
— Eu não sei como te perdoar, Tate. Nunca mais conseguiria acreditar em
você. Por favor, você precisa ir agora.
— Eu sei. Obrigado por ter me escutado, me dado essa chance de pedir
desculpas. — Ele aguardou uma fração de segundo, mas ela não disse mais nada.
Pelo menos ele estava saindo com alguma coisa. A esperança de encontrar uma
editora era um motivo para procurá-la outra vez. — Tchau, Kya.
Ela não respondeu. Ele a encarou e ela manteve o olhar, mas em seguida se
virou para o outro lado. Ele saiu pela porta em direção ao barco.
Ela o esperou partir, então se sentou na areia úmida e fria da lagoa para
carla scalaejcves
(Carla ScalaEjcveS)
#1