Um lugar bem longe daqui

(Carla ScalaEjcveS) #1
Obrigada
Da Menina do Brejo

Tate leu as palavras, então se virou e deixou o olhar se perder bem longe no
brejo, porque não podia abraçá-la. Por fim, segurou a mão dela e a apertou.
— Obrigado, Kya.
— Foi você, Tate — disse ela, então pensou: Sempre foi você.
Um dos lados do seu coração ansiava, o outro se protegia.
Ele ficou parado por alguns instantes; como ela não disse mais nada, virou-se
para ir embora. Mas enquanto subia no barco falou:
— Kya, quando você me vir por aí no brejo, por favor não se esconda no
capim feito um veado arisco. É só me chamar e a gente pode explorar um pouco
juntos. Está bem?
— Está bem.
— Obrigado mais uma vez pelo livro.
— Tchau, Tate. — Ela ficou olhando até ele sumir no meio da vegetação,
então tornou a falar: — Eu poderia pelo menos ter convidado ele para um chá.
Não faria mal nenhum. Poderia ser amiga dele. — Então, com um orgulho raro,
pensou no seu livro. — Poderia ser colega dele.


*


Uma hora depois de Tate ir embora, Kya foi de barco até o cais de Pulinho com
outro exemplar do livro na mochila. Ao chegar perto, viu-o encostado na parede
da sua loja castigada. Ele se levantou e acenou, mas ela não retribuiu o gesto.
Sabendo que havia algo diferente, ele esperou em silêncio enquanto Kya amarrava
o barco. Ela se aproximou, estendeu o livro e o colocou na mão dele. No início
ele não entendeu, mas ela apontou para o próprio nome e disse:
— Eu estou bem agora, Pulinho. Obrigada a você e a Mabel por tudo que
fizeram por mim.
Ele a encarou. Em outra época e em outro lugar, um velho negro e uma
jovem branca poderiam ter se abraçado. Mas não ali, não naquela época. Ela
cobriu a mão dele com a sua, virou-se e saiu de barco. Era a primeira vez que o
via sem saber o que dizer. Continuou comprando gasolina e mantimentos com
ele, porém nunca mais aceitou nenhuma doação do casal. E sempre que ia ao cais
de Pulinho via seu livro em pé naquela vitrine pequena, exposto para todo
mundo ver. Como um pai o teria exibido.

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