que ela pensava nele ou o via, seu coração saltava do amor antigo para a dor do
abandono. Queria que ele se decidisse por uma coisa ou outra.
Várias manhãs depois disso, ela seguiu pelos estuários em meio à névoa matinal
com a bússola na mochila, embora duvidasse que fosse precisar dela. Planejava
procurar flores silvestres raras numa língua de areia arborizada que se estendia mar
adentro, mas parte dela vasculhava os cursos d’água em busca do barco de Tate.
A névoa ficou teimosa e se demorou, enroscando seus filamentos em volta dos
troncos das árvores mortas e dos galhos baixos. O ar estava parado; até mesmo os
pássaros permaneceram calados enquanto ela avançava pelo canal. Ali perto, um
tum tum soou quando um remo bateu devagar numa amurada, e então um barco
emergiu da bruma como se fosse um espectro.
As cores, antes apagadas pela penumbra, foram tomando forma ao entrarem na
luz. Cabelo dourado sob um gorro vermelho. Como se saído de um sonho, Tate
remava pelo canal de pé na popa do seu velho barco de pesca. Kya desligou o
motor e remou para trás até um matagal para vê-lo passar. Sempre recuando para
vê-lo passar.
Ao pôr do sol, já mais calma, com o coração de volta ao lugar, ficou parada na
praia e recitou:
Poentes nunca são simples
O crepúsculo é refratado e refletido
Mas nunca verdadeiro.
A maré cheia, um disfarce,
Cobre rastros,
Cobre mentiras.
Nós não ligamos
Para o engodo do crepúsculo.
Vemos cores vivas
E nunca aprendemos
Que o sol já caiu
Para baixo da terra
Quando vemos a queimadura.
Poentes são disfarces,
Cobrem verdades, cobrem mentiras.