sentada sem dizer nada enquanto uma dor aguda atormentava o meio do seu
corpo.
— Você consegue chegar em casa sozinha? — perguntou ele, ainda sem
encará-la.
— Acho que sim.
— Vai ficar tudo bem, Kya. Toda menina passa por isso e fica tudo bem. Volte
para casa. Vou seguir você bem de longe para ter certeza de que chegou bem.
— Não precisa.
— Não ligue para mim. Agora vá indo.
Ele se levantou e foi até o barco sem olhar para ela. Ligou o motor, afastou-se
da praia e ficou esperando distante da margem até ela começar a subir a costa em
direção ao seu canal. Assim ao longe, ele era apenas um pontinho, e seguiu-a até
que chegasse à sua lagoa. Em pé na margem, ela lhe deu um breve aceno, com a
cabeça baixa, evitando o contato visual.
Da mesma forma que dera um jeito na maioria das coisas, Kya deu um jeito de
virar mulher sozinha. Mas, no dia seguinte, assim que amanheceu, pegou o barco
e foi até o posto de Pulinho. Um sol pálido parecia boiar suspenso numa névoa
espessa quando ela se aproximou do cais dele e procurou Mabel, sabendo que
havia pouca chance de ela estar ali. Dito e feito: apenas Pulinho saiu para recebê-
la.
— Oi, Srta. Kya. Já está precisando de gasolina?
Ainda sentada no barco, Kya respondeu baixinho:
— Preciso falar com Mabel, Pulinho.
— Eu sinto muito, menina, mas Mabel não está hoje não. Será que eu posso
ajudar?
Com a cabeça bem baixa, ela respondeu:
— Eu preciso muito falar com Mabel. Depressa.
— Ora, ora. — Pulinho olhou para o mar do outro lado da pequena baía e
não viu nenhum barco chegando. Qualquer um que precisasse de gasolina a
qualquer hora do dia e em que dia fosse, inclusive no Natal, podia ter certeza de
que Pulinho estaria ali, afinal ele não havia faltado uma única vez em cinquenta
anos, exceto quando seu anjinho Daisy tinha morrido. Não podia abandonar seu
posto. — Segura firme aí, Srta. Kya, vou subir correndo a estradinha e pedir para
alguma criança chamar Mabel. Se aparecer algum barco, diga que eu já volto.
— Pode deixar. Obrigada.
Pulinho subiu depressa o cais e desapareceu. Kya ficou esperando, olhando
para a baía de tantos em tantos segundos, apavorada que algum outro barco
aparecesse. Mas ele voltou em um instante e disse que algumas crianças tinham
ido chamar Mabel; Kya só precisava “esperar um pouquinho”.
Pulinho se ocupou desembalando pacotes de fumo de mascar e colocando-os
nas prateleiras, arrumando as coisas em geral. Kya ficou no barco. Por fim, Mabel
veio apressada pelas tábuas, que se sacudiam com seu peso como se um piano
pequeno estivesse sendo empurrado pelo cais. Com uma sacola de papel na mão,
não bradou um cumprimento, como teria feito normalmente, mas ficou em pé no
cais acima de Kya e disse baixinho:
carla scalaejcves
(Carla ScalaEjcveS)
#1