João de Deus | 37
João de Deus
- Como o senhor se chama?
- João.
- João de que?
- João de Deus.
Era assim que ele se apresentava e era o nome perfeito para ele.
João de Deus era um andarilho que uma vez por ano passava pelo
nosso sítio em Altinópolis. Trocava raízes e ervas medicinais por
rapadura, café, sal, arroz, pinga e outros gêneros de primeira ne-
cessidade. Tudo que ganhava era repartido meio a meio com seu
companheiro de jornada que era um jumentinho no qual nunca
cavalgou, ia sempre ao lado de João, que levava dois sacos bem
leves com as ervas, raízes e algumas latas a serem usadas como
panelas. João de Deus vivia em sintonia com a natureza, dormia
no mato quando o tempo estava bom ou procurava abrigo no
curral de alguma fazenda.
Nunca aceitou dormir no paiol ou outro lugar melhor, que fosse
fechado. Tinha que dormir em local onde pudesse fazer uma
fogueirinha para cozinhar sua comida e fazer os seus chás. João de
Deus visitou nosso sítio por muitos anos, mas só me lembro de
duas ou três visitas. Quando tinha oito anos ele adoeceu e meu
pai, o Cidonio, foi à cidade chamar o médico, Dr. Alberto, e o
farmacêutico Sr. Célio. Não houve meio de convencê-lo a ir para a
cidade, João de Deus não iria se separar de seu jumento. O médico
receitou algumas injeções que o precavido farmacêutico já tinha
em sua maleta. Meu pai ficou encarregado de aplicar as injeções,