® Piauí ed. 185 [Riva] (2022-02)

(EriveltonMoraes) #1

Os falsos créditos de madeira para a JMS foram incluídos no Sisflora pelo então gerente do sistema, Victor André Holanda Pessoa, que ocupava o cargo
de chefe de Cadastro, Transporte e Comercialização de Produtos Florestais da Secretaria do Meio Ambiente do Pará. Holanda Pessoa chegara ao cargo
em janeiro de 2019, pouco antes de fazer a inserção dos dados. E chegara por cima. Fora indicado por Parsifal de Jesus Pontes, então chefe da Casa Civil
do governador do Pará, Hélder Barbalho. A indicação, no entanto, era mais do que uma temeridade.


Na época, Holanda Pessoa já era um dos principais alvos de uma operação da Polícia Federal que investigava um grande esquema de tráfico de cocaína
dos portos brasileiros para a Europa protagonizado pelo PCC. Filho de piloto e ligado à facção paulista, Pessoa tinha uma logística própria para o
transporte aéreo de cocaína: levava grandes cargas da droga por helicóptero do Paraguai para um hangar em Americana, no interior paulista, e de lá,
em pequenos aviões, para outro galpão no aeroporto de Tomé-Açu, no interior do Pará. Dali, transportava a cocaína em carros e caminhões até os
portos de Belém e Barcarena, de onde a droga zarpava, oculta em contêineres, rumo a Europa. Em abril de 2018, nove meses antes de ser nomeado pelo
governo Barbalho, Holanda Pessoa teve um carregamento de 513 quilos de pasta base de cocaína apreendido pela PF no interior paulista. O motorista
do caminhão que leva a droga foi preso em flagrante – e Pessoa, meses depois, ganhou a promoção para gerenciar o Sisflora no governo do Pará.


O narcotraficante do PCC ficou apenas quatro meses no cargo – ele seria um dos 50 presos no ano seguinte pela Polícia Federal, acusados de tráfico
internacional de drogas, na Operação Além-Mar. Seu padrinho, Parsifal de Jesus Pontes, também caiu, mas por outro motivo: é acusado de fraudar a
compra de respiradores para pacientes infectados com o coronavírus. Foi no ambiente comandado por esse tipo de figuras que os contrabandistas
legalizaram fraudulentamente a grande carga de madeira amazônica (incluindo o ipê amarelo que foi parar em Nova York). Com isso, conseguiram
vendê-la para 18 estados brasileiros e para o exterior, auferindo um lucro total estimado pelos fiscais do Ibama em 26,98 milhões de reais. “A madeira
tem pelo menos duas grandes utilidades para o narcotráfico: serve para lavar o dinheiro da atividade e também para ocultar a própria droga nos navios
rumo à Europa e Estados Unidos”, diz Aiala Colares de Oliveira Couto, professor da UFPA (Universidade Federal do Pará) que investiga o crime
organizado na Região Norte.


Antes que Pessoa fosse responsabilizado pelo contrabando da madeira, a investigação do Ibama foi interrompida com o desmonte do setor de
inteligência do órgão ambiental patrocinado por Ricardo Salles. “Estávamos perto de puxar esse novelo quando tudo foi por água abaixo”, afirma um
fiscal do órgão sob anonimato, devido ao temor de retaliação. Com isso, o trabalho dos fiscais foi remetido para a Polícia Federal e o Ministério Público
Federal, que, por sua vez, considerou não haver crime de âmbito federal e mandou o caso ao Ministério Público do Pará – que denunciou até agora
apenas um personagem da fraude: o dono da Coexpa, Bruno Atayde Leão, por crime ambiental. Consultado pela piauí, Pessoa, que atualmente
responde em liberdade ação penal em que é acusado de tráfico de drogas, associação criminosa e lavagem de dinheiro, disse ter recebido as acusações
“com perplexidade” e mandou dizer que está à “disposição das autoridades competentes para, ao modo e tempo correto, prestar quaisquer
esclarecimentos que porventura se façam necessários”. (colaborou Eduardo Goulart)

Free download pdf