® Piauí ed. 185 [Riva] (2022-02)

(EriveltonMoraes) #1

Enquanto os partidos da esquerda permaneciam divididos, a insatisfação com a


democracia neoliberal manifestou seus primeiros sinais. Muitos jovens estavam
afastados do sistema político. Na primeira década do século XXI, a apatia se
transformou em raiva, especialmente entre os estudantes secundaristas e universitários
do sistema educacional privatizado que segregava classes sociais.


A Revolução dos Pinguins (assim batizada em razão das cores dos uniformes
escolares), em 2006, foi o primeiro indicativo de um descontentamento mais profundo.
Centenas de milhares de pessoas marcharam em protesto contra as mensalidades
escolares e pedindo a construção de um sistema educacional de qualidade para todos.
A Concertación, que estava em seu quarto mandato consecutivo, conseguiu evitar a
ampliação do conflito fazendo pequenas reformas e prometendo melhorias futuras.


A situação mudou em 2010, quando Piñera foi eleito presidente. Ele levou para o
governo os herdeiros da ditadura de Pinochet, expondo os mecanismos de acumulação
e mercantilização antes ocultos sob um verniz progressista. No ano seguinte, protestos
liderados por movimentos sociais independentes dos partidos políticos da transição
eclodiram em todo o país, coincidindo com mobilizações em outras partes do mundo,
como a Primavera Árabe e o Occupy Wall Street.


Movimentos ambientais começaram a se mobilizar contra o modelo econômico
extrativista e a destruição da natureza. E o que mais chamou a atenção: universitários
foram às ruas mais uma vez para protestar contra a segregação de classes produzida
pelas altas mensalidades cobradas pelas faculdades particulares e públicas, que
geravam onerosos endividamentos, geridos por bancos privados. Para a geração
seguinte de líderes políticos, forjada por esses protestos, da qual Boric faz parte, estava
claro que os fracassos do sistema educacional eram parte de um problema mais amplo
relacionado aos limites e às inconsistências da transição democrática.


A Concertación – rebatizada como Nueva Mayoría, com a inclusão do PCCH e outros
partidos de esquerda na coalização – teve uma última oportunidade de responder de
modo significativo aos protestos estudantis quando, mais uma vez, derrotou a direita
nas eleições presidenciais de 2013. Michelle Bachelet (do Partido Socialista), que já
tinha ocupado a Presidência entre 2006 e 2010, voltou ao poder com um mandato para
fazer reformas, incluindo a educação gratuita e a substituição do sistema
previdenciário.

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