® Piauí ed. 185 [Riva] (2022-02)

(EriveltonMoraes) #1

Tonhão, o ex-funcionário da família Faccin e dono da Canaã do Norte, por onde passou o carregamento de ipê amarelo, tratou de reservar o seu
quinhão na grande farra da grilagem e do desmatamento dentro da Jamanxim. Em abril de 2016, registrou para si, por meio do CAR, uma área de 5,
mil hectares (equivalente ao bairro Barra da Tijuca, no Rio) dentro da floresta. Batizou sua área como Fazenda Toca da Onça. O passo seguinte, como
convém à cartilha do grileiro, foi desmatar o local. Atualmente, metade da propriedade é ocupada por pastos, de acordo com dados do Inpe. Não há
acesso à Toca da Onça por terra. Dez quilômetros antes da fazenda, uma barreira com corrente e cadeado impede a passagem na única estrada de chão
batido, muito mal conservada, que leva à propriedade. Nas imediações, é possível detectar um ou outro ipê amarelo, que muito provavelmente só
segue intacto na natureza porque não atingiu o ponto de corte. De 2016 a 2020, o CCCA, parceira da piauí nesta reportagem, estima que foram
extraídos 80 mil metros cúbicos de madeira da Toca da Onça, dos quais 76,5 mil (95%) em 2019, exatamente o ano em que a madeireira de Tonhão
comprou o lote ilegal de ipê amarelo que foi parar em Nova York.


Treze dias depois de pagar 50 mil reais pela madeira da JMS, a Canaã do Norte, de Tonhão, revendeu o carregamento para outra empresa, a Coexpa
Comércio e Exportação de Produtos da Amazônia, com sede em Belém. Embolsou 437 mil reais, nove vezes mais do que pagara duas semanas antes, e
isso sem fazer qualquer beneficiamento na madeira que justificasse um lucro tão grande. O procurador Ubiratan Cazetta, do Ministério Público Federal
no Pará, explica os números da operação. “É comum os contrabandistas de madeira simularem altos lucros na compra e venda de madeira para
justificar a entrada do dinheiro obtido com a venda final do próprio produto ou de outros crimes, como corrupção e tráfico de drogas. É um caso típico
de lavagem.”


Assim como a JMS e a Canaã do Norte, a Coexpa também tem um histórico de infrações ambientais: a empresa já foi autuada em 225 mil reais pelo
Ibama, e seu proprietário, Bruno Leão Atayde, é réu em duas ações penais na Justiça estadual paraense, acusado de delitos contra o meio ambiente.
Consultada sobre o lote ilegal de ipê amarelo, a Coexpa emitiu uma nota em que afirma ter prestado todas as informações para “o pleno esclarecimento
dos fatos perante os órgãos ambientais competentes”. Na nota, a Coexpa acrescenta que faz “rigoroso procedimento de análise interna” de seus
produtos e fornecedores, avaliando “requisitos como licenciamento ambiental, existência de lastro comprobatório de origem de produtos, antecedentes
de autuação ambiental, bem como regularidade nos sistemas oficiais de controle, tanto em âmbito estadual como federal.” Não disse nada sobre a
falsificação das guias florestais do ipê, que estão na origem da fraude.

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