Um General na Biblioteca

(Carla ScalaEjcveS) #1

Era evidente que havia entendido a sua manobra e, tivesse ou não
encontrado o colar, não faria confidências. Enrico resolveu abrir o jogo:
— Hoje de manhã perdeu-se um objeto bem ali — disse, parando. — O
senhor o encontrou? — e calou-se, esperando que o outro perguntasse: “Que
objeto?”. Perguntou, de fato, mas antes ficara pensando um pouco sobre o
assunto; um pouco demais.
— Um colar — disse Enrico, torcendo a boca com jeito de quem se refere a
coisas pouco importantes; e ao mesmo tempo fazendo um gesto como quem
estica entre as mãos um cordão, um cadarcinho, uma correntinha de criança. —
É uma recordação, somos muito apegados a ele. Portanto, se o senhor me der
eu lhe pago — e fez menção de pôr a mão na carteira.
O desempregado Fiorenzo avançou uma das mãos, como para dizer: “Não
está comigo”; mas evitou dizer e ficou com a mão estendida, falando, em vez
disso:
— É um trabalho duro, procurar alguma coisa ali no meio... vai precisar de
vários dias. O campo é grande. Enquanto isso, podemos começar a ver...
Enrico apoiou de novo as mãos no guidom.
— Achei que o senhor já tivesse encontrado. Pena. Paciência. Sinto muito,
sobretudo pelo senhor.
O desocupado jogou fora a guimba.
— Meu nome é Fiorenzo — disse —, podemos fazer um acordo.
— Sou o arquiteto Enrico Pré. Tinha certeza de que íamos começar a falar
sério.
— Podemos fazer um acordo — repetiu Fiorenzo —, tanto por dia; e depois,
tanto na entrega do objeto, quando eu o achar.
Enrico virou o tronco quase num pulo e, ainda se mexendo, não sabia se o
agarraria pelo casaco ou se apenas queria testar mais uma vez suas reações. O
fato é que Fiorenzo parou sem fazer menção de se defender, esticando com um
irônico ar de desafio o seu rosto de pássaro depenado. E Enrico achou impossível
que nos bolsos daquela jaqueta apertada e molenga pudessem estar as quatro
voltas de pérolas: se o homem sabia alguma coisa sobre o colar, era difícil
imaginar onde o teria escondido.
— E quanto você quer para rastrear este campo? — perguntou. Passara ao
“você”.
— E quem lhe disse que ele ainda está no campo? — retrucou Fiorenzo.
— Se não está no campo está na sua casa.
— A minha casa é aquela — disse o homem, e apontou para fora da estrada.
— Venha.
Onde os primeiros e esparsos prédios da periferia dão as costas para os
campos nevoentos, ali era o limite dos pastos de Fiorenzo. E próximo dessa

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