National Geographic - Portugal - Edição 221 (2019-08)

(Antfer) #1
GRUTAS DO BORNÉU 41

PASSANDO POR UMA ANTIGA PILHA de guano na
descida, a dupla espera fazer história. Antes disso,
os dois já tinham rastejado até ao interior da Gruta
dos Ventos (Wind Cave), nas profundezas de um
sistema de grutas conhecido como Água Limpa
(Clearwater), esperando encontrar uma passagem
para a Gruta das Cobras (Racer Cave), que integra o
sistema Cobras-Páscoa (Racer-Easter System).
A busca de uma ligação entre grutas significa-
ria criar um “supersistema”, um dos mais longos
labirintos subterrâneos do planeta. À medida que
os homens desciam, rastejando e criando pontos
de apoio na rocha para fixar cordas de espeleo, as
probabilidades de sucesso pareciam razoáveis.
Sabiam de antemão que o sistema Água Limpa
se prolongava por 226 quilómetros e que em algu-
mas das grutas existiam rios turbulentos, ao passo
que o sistema Cobras-Páscoa continha câmaras
tão grandes que poderiam facilmente acolher um
avião comercial e ainda sobraria espaço. Por ou-
tras palavras, o calcário subjacente a esta região,
sob o Parque Nacional de Gunung Mulu, na Malá-
sia, apresenta alguns dos maiores buracos, alguns
dos túneis mais largos e alguns dos mais arrebata-
dores espaços vazios existentes no planeta.
Se o leitor é um daqueles exploradores que gos-
tam de rastejar para lugares escuros, quentes e hú-


midos para descobrir outros lugares escuros, quen-
tes e húmidos, o Bornéu é a sua terra de sonho.
Imagine Frank e Cookie lá em baixo, cobertos
de lama e com sorrisos nos rostos, prestes a uni-
rem dois sistemas de grutas numa única e enor-
me cavidade. Para os espeleólogos, é a sua razão
de ser, até porque é raro concretizar estas liga-
ções entre sistemas. No mundo frequentemente
obscuro da exploração subterrânea, a proeza se-
ria considerada extraordinária.
Noutro local abaixo da superfície terrestre,
nas entranhas da Gruta das Cobras, outra equi-
pa deslizava até à sua posição. Estes homens
também transportavam martelos e brocas e, em
breve, começariam a bater nas paredes da gruta
e a perfurar a rocha, ouvindo-se mutuamente,
na esperança de que o ruído os conduzisse a
uma ligação e lhes garantisse um lugar histórico
nos livros de recordes.
Pouco acima deles, eu estava sentado numa
grande galeria, escutando os instrumentos de
perfuração. A galeria estava intacta. Fora des-
coberta poucos dias antes e eu era uma das pri-
meiras pessoas a entrar nela. No local onde me
encontrava sentado, rodeado de estalagmites
gigantes e cogumelos de pedra colossais, a gruta
revelava sons exuberantes.

No final de uma manhã


sufocante de Abril, dois


esguios espeleólogos


britânicos, chamados Frank


e Cookie, descem por um poço


escorregadio e húmido sob a


floresta tropical do Bornéu.

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