A Santa Aliança

(Carla ScalaEjcveS) #1

Eva baixou os olhos. Estavam voltando ao passado, a tudo que a psicóloga tinha
insistido repetidamente que desconsiderasse. Eva sabia que a terapeuta tinha razão.
Era sua última oportunidade, não devia olhar para trás; tal qual o Senhor disse a
Lot: “Não olhes para trás”, para Sodoma. A mulher de Lot olhou e virou estátua de
sal. Eva simplesmente desmoronaria, sumiria, se fizesse o mesmo.



  • Eva? – Anna a olhava, sorrindo de leve.

  • Estou, sim – respondeu. – Faz um ano.

  • Você trabalhava no quê?

  • Sou jornalista. – Apressou-se a se corrigir: – Era jornalista.

  • Jornalista – repetiu Anna. – O Torben não me disse nada.
    Eva olhou para Anna. Todos os sinais de entusiasmo protetor tinham
    desaparecido, e manchas vermelhas surgiram no pescoço de Anna. Eva baixou os
    olhos.

  • Mas... – Anna deu uma engasgada e pigarreou. – Você não é mais jornalista?
    Eva, confusa, olhou para ela.

  • Não, como já lhe disse, estou parada.

  • Mas não gostaria de voltar a ser?

  • Espero voltar, sim, mas há muito pouco trabalho. E, se o que a preocupa é que
    eu largue o emprego daqui a uma ou duas semanas, posso garantir que...

  • Já vou dizendo: você não pode escrever sobre o Pomar – a subdiretora a
    interrompeu. – A relação entre crianças, pais e instituição é sigilosa. Você não vai
    poder escrever nada sobre o que vir aqui.
    Por um instante, as palavras ficaram suspensas no ar. Eva não sabia o que dizer.

  • Claro que não – disse por fim. – Eu jamais pensaria em fazer uma coisa dessas.
    De resto, eu escreveria o quê? Quero dizer, no fim das contas é só uma creche. –
    Olhou para a subdiretora e, na hora, se arrependeu do que acabava de afirmar. –
    Não que o trabalho que vocês desenvolvem não seja importante. Eu me refiro
    simplesmente ao fato de que não há grande coisa para revelar, se me entende.

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