tijolinho. Marcus tentou a porta. Estava aberta, e por que não estaria? Ali, ao norte
de Copenhague, reinavam a paz e a ordem. Fechou a porta atrás de si e ficou quieto
na lavanderia, escutando. Hans Peter continuava no banho. Marcus ouvia o som da
água que vinha do aquecedor. O lugar cheirava um pouquinho a fumo de
cachimbo. Tirou com muito cuidado os sapatos. Por precaução, deu uma olhada no
celular – totalmente desligado. Já havia se assegurado disso em Copenhague, antes
de ter saído no carro com o cadáver.
Voltou a aguçar os ouvidos antes de entrar na sala. Nem sinal de Ellen Blikfeldt.
Talvez estivesse no andar de cima. Tinha de se certificar antes de entrar no
banheiro. Subiu a escada em quatro passadas silenciosas. Já estava no piso superior.
Deu uma olhada no quarto. Pelas marcas no colchão, só haviam dormido de um
lado da cama. Ellen Blikfeldt não estava em casa. Marcus e o velho estavam a sós;
nunca haveria chance melhor.
Já descia a escada quando tocaram a campainha. Parou. Ouviu tocarem de novo.
- Já vou! – gritou Hans Peter.
Marcus tornou a subir os degraus, correndo. O quarto dava numa sacada. Olhou
para baixo. Um pulo de poucos metros, não era nada, não via problema. Ouviu
vozes que vinham da lavanderia. A chance tinha passado. Precisava sair de lá. Abriu
a porta do quarto e prestou atenção. Continuavam conversando na lavanderia.
Poderia pular para a varanda sem que o vissem. Passou as pernas pela beira da
sacada, agarrou-se à velha grade de ferro fundido e se deixou cair. Nesse instante,
pensou em livrar-se de tudo, das obrigações e da responsabilidade; da
responsabilidade por tudo à sua volta. Talvez tenha sido o momento em que ficou
solto no ar o que lhe deu aquela ideia estúpida e inesperada... De todo modo, já
estava pronto a assumir sua responsabilidade quando voltou a ter os pés firmes nas
duras lajotas da varanda. O velho precisava morrer. Não havia mais remédio.