o cachorro embora. – O papai está me ouvindo?
- Não. Agora está na cozinha.
- Pernille... – Não conseguiu continuar. Seus olhos se encheram de lágrimas.
- Está chorando, meu bem?
- Não conte para ele. – Tentou sufocar o barulho do choro.
- Não vou contar.
- Ele se preocupa tanto! É só que...
- Eu sei. É duro.
- Minha vida é uma merda – disse Eva, e enxugou as lágrimas com a manga ainda
úmida de chuva. - Não diga isso.
- Mas é. Quando sento aqui e olho a sala, cheia dessas placas de MDF, desses
parafusos, desses outros trastes... - Ele já está voltando – sussurrou Pernille, referindo-se ao pai da enteada.
- OK. – Eva se endireitou, como se ele pudesse vê-la pelo telefone. – Diga que
tudo está às mil maravilhas e que hoje à noite vou sair com uma amiga. - Eva...
- Please, Pernille.
Silêncio na linha. Ouviu o pai andar ao fundo. Pernille pigarreou e disse: - Então está bem, parece fantástico. Tenha uma boa noite, querida.
- Obrigada, Pernille. Você é um amor.
- E lembre-se: o saca-rolha está debaixo do fogão.
Eva riu em meio ao próprio choro. - Eu te adoro, querida. Seu pai também.
- Eu também adoro vocês.
Largou o celular de qualquer jeito no sofá. Fechou os olhos para não ver o piso,
que precisaria raspar, as paredes descascadas, as coisas ainda por montar, os fios que
pendiam do teto...