Claudia sacudiu negativamente a cabeça e bateu no volante com raiva ou
impotência; foi a palavra “amantes” o que provocou essa reação. Deu uma freada
brusca, levou a mão direita à boca e a mordeu. Eva viu a mão sangrar.
- No! – Agarrou a mão de Claudia, que ainda tinha os dentes fincados nela, e
disse em dinamarquês. – Pare já com isso!
Claudia enfim parou de se morder. Talvez tivesse sido o uso do dinamarquês o
que operou o milagre. Finalmente brotaram as lágrimas que Claudia vinha
reprimindo. Chorou em silêncio, total silêncio. Eva tentou abraçá-la, mas era difícil
fazer isso num carro tão pequeno. Foi embaraçoso. - Será que alguém está nos seguindo? – perguntou Claudia, atrapalhada pelas
lágrimas, por um instante pensando na sobrevivência em meio a toda aquela
sensação de impotência. Estava sentindo um desejo profundo de morrer, misturado
com aquele instinto de preservação que sempre acaba se impondo.
Eva se voltou. Pelo vidro de trás, olhou para uma estrada poeirenta de montanha,
com oliveiras de ambos os lados do caminho. - Não. Ninguém está seguindo a gente.
Silêncio, do tipo que faz barulho. Eva cedeu ao choro, sem dizer nada; durante
alguns segundos, não houve espaço para outra coisa.
Pausa. Claudia tomou fôlego. Olhou para Eva. - Quem é você? É jornalista? Não devia ter vindo. Imagino que você saiba o
tamanho do perigo.
Olhou para a própria mão, para as poucas gotas de sangue, como se fossem um
aviso de todo o sangue que seria derramado antes que aquela tragédia chegasse ao
fim. - Perigo por estar aqui?
- De que vejam você comigo.
- Também é perigoso para os outros serem vistos comigo. Já tentaram me matar.
- Eva tirou do pescoço o lenço de seda. Claudia viu as marcas de estrangulamento.