Distrito de Klampenborg, Gentofte, Grande Copenhague – 21h05
Marcus não tinha achado onde se abrigar bem da chuva. As folhas das árvores
ainda não tinham caído, e por isso resolveu se espremer contra a fachada; ao menos
se protegeria um pouco. Pôs a cabeça na quina da casa, com cuidado, e olhou para a
sala de Hans Peter Rosenkjær. Depois que anoiteceu, ficou mais fácil seguir a rotina
do velho. Hans Peter tinha acendido as luzes nos cômodos da casa, e Marcus sabia
que dava praticamente para ir até as janelas e olhar para dentro, sem se arriscar ser
visto pelo velho. Hans Peter era viúvo. Agora Marcus sabia, depois de ter seguido
de perto suas idas e vindas. Hans Peter tinha saído de casa ao meio-dia. Para sorte
de Marcus, o velho tinha deixado o carro em casa e ido a pé para a mercearia;
depois, também a pé, foi ao cemitério. Uma vez lá, ficou sentado num banco por
quase duas horas, lendo o jornal e fumando cachimbo antes de, finalmente, voltar
para casa. Marcus tinha visto a lápide – “ELLEN BLIKFELDT. 1923-1987”. Hans Peter
enviuvara fazia anos; estava pronto para se reunir à mulher.
Marcus estava preparado para esperar que o velho fosse deitar. Então entraria de
fininho na casa, talvez pelo porão, cujas portas – ele tinha visto – estavam com as
dobradiças bem soltas. Lá dentro, tiraria a roupa molhada. Subiria para a sala e
continuaria escada acima. Acharia Hans Peter no quarto. Um travesseiro, nem
macio nem duro, com que cobrir-lhe o rosto; não deixaria nem uma marca sequer;
pareceria parada cardíaca. Naquele instante, o velho estava cuidando do jantar na
cozinha. Provavelmente se passariam horas até resolver ir para a cama. Era tempo