A Santa Aliança

(Carla ScalaEjcveS) #1

desse jeito? Se Malte não tivesse presenciado e desenhado a morte do tio antes de
terem mandado o torpedo... E Helena, embora tivesse sofrido muito, resolveu fazer
o jogo deles porque sabia o que estava em risco – a monarquia, a própria Helena e
toda a sua existência, o futuro das crianças da corte, o futuro de Malte, o futuro que
o palácio lhe prometera e que estava garantido. Desde que ela se mantivesse leal.
Helena arrancou a página da agenda da creche. Só podia ter sido isso. Arrancou
para que ninguém pudesse confrontar o horário em que ela deixou Malte lá e o
menino falou da morte do tio com o horário em que mandaram o torpedo.
Eva estava ao lado da pia esculpida. Aproximou o crânio das bordas do mármore,
como uma menina que busca duas peças que se encaixem num quebra-cabeça. Se
Brix tinha caído, talvez tivesse dado com a cabeça contra alguma coisa próxima do
chão, perto de...
Ouviu um clique como o do trinco da grade da creche, naquele seu primeiro dia
de trabalho. Não, agora o clique era só na cabeça de Eva. Um som leve quando,
subitamente, as três fraturas no crânio se encaixaram nas três pontas da parte
inferior da concha. Acoplaram-se à perfeição. Clique. Eva se deitou no chão por um
instante, como Brix devia ter jazido durante os últimos segundos, tal qual um
animal ferido e indefeso; como Martin tinha jazido naquele dia terrível num
deserto longínquo; como a própria Eva tinha jazido em casa, tempo demais,
esperando – apenas esperando – que a vida voltasse a se apoderar dela. Depois se
levantou, correu para a porta do Taffelsalen e encostou a orelha nela. Quando
achou que o caminho estava livre, abriu a porta e iniciou sua fuga do palácio.

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