A Santa Aliança

(Carla ScalaEjcveS) #1

adiantou nada, porém. O som atravessava tudo; tinha sido concebido para isso,
para penetrar até o sono mais profundo, acordar as pessoas, berrar na cara delas que
tinham que se levantar o mais depressa possível e sair para a rua, porque havia um
incêndio.


Caos. No corredor, no breu, silhuetas de mulheres, uma que gritava, frases pela
metade, todo tipo de sotaque, entradas e saídas, portas fechadas à chave, tentativas
desesperadas de achar chave no escuro, bolsas, itens de primeira necessidade. E, em
meio a tudo isso, Eva pensava que era como se uma psicose coletiva tivesse se
apossado do abrigo de mulheres; como se de repente tivessem destampado o medo
e todo ele tivesse se esparramado de uma vez só; como se as mulheres, em toda a sua
fragilidade, com os nervos em frangalhos por uma vida cheia de angústia, estivessem
convencidas de que tinha chegado a hora. Liv também estava ali. Tinha estado o
tempo todo ou a tinham chamado? A voz da diretora mal conseguia impor-se ao
barulho, mas Eva a ouviu porque estava logo ao lado.



  • Calma! – gritou Liv. – É o alarme de incêndio, mas o fogo é no porão e, se
    sairmos todas pela escada e descermos tranquilamente, não vai acontecer nada. –
    Repetiu a mensagem mais algumas vezes. – Nada de pânico. Calma! Take it easy!
    Uma somali com um bebê de colo parecia em choque. Eva tratou de acalmá-la.

  • No worry – repetiu várias vezes. No fim, talvez porque o bebê desatou a chorar,
    a mulher saiu do estado catatônico e seguiu as outras.
    A escada parecia o cenário de um filme de catástrofe.

  • Smoke! – gritou uma mulher.
    Eva, entretanto, não viu nem cheirou fumaça em parte alguma. Chegaram à
    recepção, e aí a fumaça surgiu. De repente. Densa e preta. Era impossível ver de
    onde vinha; talvez do porão; talvez estivesse subindo pelo poço do elevador ou se
    infiltrando pelas frestas do velho edifício. Liv estava na porta. Ou não era ela? Por

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