Hareskoven, Grande Copenhague
Eva não via a casa desde abril. Tentou lembrar quando exatamente. Não ia lá
desde o ataque, desde a noite em que ele lhe tinha baixado as calças e a tinha tocado.
O que são as coisas: era o último homem que a tinha tocado.
- Vamos resolver logo isto – ela disse em voz alta, e atravessou a rua daquele
bairro residencial.
Estava a poucos metros da casa. Não havia carros. Sentia-se a salvo, uma sensação
que vinha tendo desde aquela noite em abril em que o abrigo de mulheres pegara
fogo. O episódio teve muita repercussão na mídia. Dizia-se que o incêndio tinha
sido provocado, que o marido de uma das abrigadas tinha entrado para matá-la –
ou para matar todas – e que tinha sido Eva quem o afugentou. O sangue na escada,
o relato sobre a maneira como o homem tinha conseguido entrar... Algumas
abrigadas tinham visto dois homens fugirem de lá. A polícia continuava sem ter
pistas, e isso apesar de Eva ter colocado tudo por escrito. Tinha exposto todas as
conexões. Ninguém lhe tinha dado ouvidos. Ninguém quis publicar seu relato. A
foto de Eva, porém, saiu na mídia – a mulher valente que tinha enfrentado dois
homens. Chegou-se a especular que tinham sido uns árabes, que aquilo tinha sido
um “crime de honra” malsucedido. Ninguém especulou que Eva tivesse dito a
verdade; ainda assim, ela recebeu uma proposta para trabalhar na seção de moda de
um jornal. Ficou tentada a aceitar, só para voltar a ganhar um pouco de dinheiro,
ter sua própria moradia num lugar decente; mas ouviu a voz de Lagerkvist, que, do