- Posso?
Ele tinha parado no caminho do jardim, nas poucas lajotas que levavam à porta
da frente. Eva fez que sim. O homem veio ao seu encontro. Ela ficou um bom
tempo olhando o envelope que estava na mão dele, de papel grosso, creme, com o
nome de Eva escrito à mão numa caligrafia antiquada. - É para a senhora – disse o homem depois de um tempo, talvez cansado de ficar
ali com o envelope estendido.
Eva o pegou. - Obrigada.
- Posso dizer mais uma coisa?
- O quê?
- A senhora tem um lindo jardim. Eu me dou muito bem com plantas. Não
tenho dúvida de que a senhora e eu poderíamos passar boas horas trocando
experiências – ele disse, e, para rematar, esboçou um sorriso. - Com certeza.
- E agora, com sua licença... – disse o homem, e fez uma ligeira reverência, quase
imperceptível, antes de girar sobre os calcanhares e voltar para o carro.
Eva olhou para a carta. Abriu o envelope. Leu. Não entendeu nada. Releu, a
começar do cabeçalho impresso: “Capítulo das Ordens Régias de Cavalaria da
Dinamarca”. Depois o conteúdo, uma única frase: “Em 13 de junho, Sua Majestade
a rainha outorgou à jornalista Eva Katz a Cruz de Cavaleiro de Primeira Classe”.
Eva sentou na escada. Tornou a ler a carta. Gostava das palavras: à jornalista Eva
Katz. Se a intenção era aquela, funcionava. “Se não podem acabar com a gente, eles
nos convidam a entrar, nos envolvem.” Veio à tona uma lembrança, como
costumam fazer as lembranças quando a gente tenta compreender algo e só as
vivências passadas ajudam nisso. Lembrou-se de quando, menina, sentada na
cozinha, não queria fazer a lição de casa e gritava isso ao pai. Ele sempre acabava
dizendo: “Então você fica não querendo – mas vai, sim, ter que obedecer”.
carla scalaejcves
(Carla ScalaEjcveS)
#1