A Santa Aliança

(Carla ScalaEjcveS) #1

Centro de Copenhague – 10h40


“Lobista”, pensou Marcus. Uma palavra que felizmente dava sono na maioria das
mulheres. O resultado é que pelo menos metade da população nem ligava para o
tema. Por isso quase ninguém escrevia sobre lobbies. Que jornal se arriscaria a
publicar assuntos que fariam as mulheres saírem da página? Grupos de pressão;
decisões sussurradas em saguões de hotel; legislação que se tenta influenciar nos
corredores do Parlamento; pressão que se exerce nas antessalas do poder. Assim se
podia descrever o trabalho de Marcus. Assim o próprio Marcus descrevia esse
trabalho.
Acabava de sentar num banco de rua. Não costumava fazer isso nunca; não se
lembrava da última vez em que tinha sentado no centro da cidade, no miolinho
urbano, em pleno horário de trabalho. Estava orgulhoso do lobby para o qual
trabalhava; estava mais do orgulhoso. Embriagado? Preferia dizer “espiritualmente
embriagado”. Outros pertenciam a lobbies de verdadeiras merdas, como o fumo, as
armas, o petróleo, as cotas de gás carbônico e os paraísos fiscais. Marcus defendia
um produto sem o qual não conseguiríamos viver – a Instituição. Um sentimento
que se teria definido melhor como amor à humanidade o percorreu quando esticou
as pernas e olhou ao redor para contemplar a Instituição. As pessoas saíam do
metrô; os ônibus iam pelas ruas; sinal vermelho, os carros paravam; luz verde no
semáforo de pedestres, os cidadãos atravessavam; ninguém se queixava; os aviões
sobrevoavam a cidade e nos levavam de um a outro lugar pacífico da Europa,

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