Veja São Paulo - Edição 2649 (2019-08-28)

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20 Veja São Paulo 28 de agosto, 2019


da capital paulista. Com Greenpincel, abordou
questões relacionadas ao meio ambiente. Nenhuma
delas, porém, lembra, nem vagamente, os primei-
ros traços feitos às escondidas no muro da rua de
trás da escola, a Emef Maurício Simão, no Jardim
Martinica, aos 12 anos, quando ele ainda se assi-
nava Cobra, com “C”.
No início, a família não apoiava a ideia. “A gen-
te não entendia esse negócio de grafite. Na época,
duvido que alguém entendesse. Queríamos que ele
fizesse faculdade na área de informática”, lembra
a mãe, Maria Zineide Fernandes Léo, 73. Hoje
quem gere a carreira de Kobra é sua esposa, An-
dressa Munin, 33. Para ela, vale seu nome de ba-
tismo, Carlos Eduardo Fernandes Léo, pai do pe-
queno Pedro, de 3 anos. Sobre a época do primeiro
encontro, que rolou no antigo Playcenter, Andressa
tem memórias fortes: “Vivíamos um momento di-
fícil. Eu tinha perdido meu pai havia dois meses e
ele estava no auge da depressão, tomando mais de
doze comprimidos por dia”. Eles moram atualmen-
te nos Jardins, perto do clube A Hebraica. No mes-
mo bairro fica o espaço onde recebem coleciona-
dores — o ateliê está na Vila Madalena. Juntos,
eles frequentam as igrejas Comunidade Cristã e
Bola de Neve. “Ele não gosta de levantar bandeira,
mas ter uma fé o transformou e o ajudou a tomar
decisões importantes”, revela a esposa.
Outra fonte de estímulo do muralista é o sonho
de criar um instituto para que crianças e adoles-
centes recebam gratuitamente uma formação em
artes visuais. “Tenho procurado lugares para pôr
a ideia de pé. Ainda estou em dúvida se será na
periferia ou em bairros mais centrais.” A dispo-
sição para o trabalho eventualmente é comprome-
tida por questões de saúde: ele tem pedras nos
rins, em decorrência da alimentação bagunçada
pelos horários alternativos. A intoxicação por me-
tais pesados presentes nas tintas, resultado de
anos pintando paredes sem usar máscara, foi cura-
da. Se o assunto é o envolvimento em iniciativas
da esfera pública, ele fala com cautela, fica qua-
se em cima do muro. Em 2017, quando o então
prefeito, João Doria, decidiu apagar os grafites
da Avenida 23 de Maio, o desenho de Kobra foi
inicialmente poupado e depois vandalizado. “O
que vemos é um grande desperdício. Somos pri-
vilegiados por ter os melhores artistas pintando
espontaneamente nas ruas. Com um orçamento
baixo, poderíamos transformar São Paulo.” ß

VIDA EM FAMÍLIA
Acima, com a esposa,
Andressa Munin, e o
filho, Pedro. No meio,
o muralista com máscara
de proteção, cuidado que
passou a ter após uma
intoxicação por metais
pesados existentes nas
tintas. Abaixo, retrato com
Ziraldo na Praça Benedito
Calixto: “ É certeza que ele
não vai lembrar de mim”

ALEXANDRE BATTIBUGLI

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