Ele não foi seduzido pela
ideologia, da qual já era convicto,
mas pelas aulas de retórica que
faziam parte do curso. Foi uma
descoberta, o reconhecimento
de um dom. Através dele, Adolf
veio a se tornar o Führer, capaz
de convencer o indeciso
e de fanatizar o adepto
alma ao partido – e, através deste, a si mesmo. Hitler sem-
pre reconheceu o incrível domínio que ele exercia sobre os
outros, e aquela era a oportunidade que ele buscava. Des-
sa vez, diferentemente de quando havia tentado ser artista,
todos os vetores convergiam a seu favor.
Na oratória estava, sem dúvida, seu dom. Ele era ab-
solutamente consciente disso, a ponto de, em Mein Kam-
pf, dedicar um capítulo ao tema. Em “A Luta nos Primeiro
Tempos: A Importância da Oratória”, o futuro líder da Ale-
manha descreveu com precisão cirúrgica o fenômeno que
chamou de “sugestão da multidão”. Para aquele gênio da
manipulação, “as reuniões de grandes multidões são neces-
sárias, pois quando o indivíduo acometido pelo desejo de se
alistar em um movimento, mas que teme estar só, ao assistir
a elas, recebe ali a primeira impressão de uma numerosa co-
munidade, que exerce um efeito revigorante e estimulante
na maioria das pessoas”. Hitler sabia que “um homem que
chega a essas assembleias cheio de dúvidas e vacilação sai
dali intimamente fortalecido, convertendo-se em um movi-
mento da comunidade”, e explorava isso ao máximo.
Sua retórica se baseava na polêmica. Além disso, im-
primia uma paixão nos seus discursos capaz de inflamar o
mais frio dos ouvintes. Não buscava explicar o programa
e a doutrina do seu partido, mas, sim, explorar as emoções
da plateia. Os orgulhosos alemães tinham sido humilha-
dos na guerra e vilipendiados no tratado de paz. E era o
orgulho ofendido desse povo que Hitler alimentava com
seu dom e sua fúria. Ele semeava ódio e, mais que isso, a
necessidade de punir os culpados, fossem eles comunis-
tas, liberais, democratas, capitalistas ou, principalmente,
judeus – os bodes-expiatórios da frustração germânica.
A força da convicção que imprimia nos seus ouvintes o
catapultou. Em 1921, apenas três anos de sua filiação, Hi-
tler se tornou presidente do NSDAP. Na verdade, mais
que isso: ele se tornou o próprio partido.
tanto que, como ele mesmo descreve em sua autobiogra-
fia, Mein Kampf, acabou sendo ordenado a se “incorporar
a um regimento de Munique, nominalmente na qualida-
de de instrutor”. Foi o primeiro passo de uma “brilhante”
carreira política e, também, o começo de sua ascensão. Os
discursos que fazia aos outros membros do Reichswehr,
durante o curso que ministrava, eram impregnados de um
anti-semitismo inflamado. Mas a ira de Adolf não se li-
mitava aos judeus. Ele se dedicava igualmente a atacar os
comunistas, tidos como tão culpados quanto os israelitas
pela derrota da Alemanha.
O cabo Hitler aprendeu a dominar a plateia, a explo-
rar o medo dos que ouviam e transformá-lo em raiva, a
despertar nas pessoas a emoção que bem entendesse. E o
artista frustrado, finalmente, encontrou sua arte: a retóri-
ca. Era um mestre, e sabia disso. “No transcurso de meu
palavreado, reconquistei para a nação e a pátria não direi
centenas, mas milhares de camaradas”, registrou Adolf em
Mein Kampf. E ele não estava sendo imodesto. O chefe da
chancelaria de Hitler, Philipp Bouhler, afirmou categoria-
mente que o nazismo “só triunfou porque Adolf Hitler es-
tava no comando”, pois “ele é o movimento, uma vez que
incorpora em sua pessoa a ideia do nacional-socialismo”.
DE SOLDADO A POLÍTICO
As variáveis da equação que resultaria no fenômeno
Adolf Hitler foram, finalmente, relacionadas através de
missão dada a ele. Em 12 de setembro de 1919, Adolf foi
enviado como observador a um comício, do qual partici-
paria o pequeno Partido Nacional-Socialista dos Traba-
lhadores Alemães.
Entediado, Hitler ouviu as propostas políticas dos ora-
dores, que buscavam nada além de celebrar a paz com os
vencedores. De repente, porém, o tédio do futuro Führer
deu lugar a um ódio inflamado quando um dos discur-
sadores começou a defender a separação da Baviera. “Em
vista de tais coisas, não me restou mais que solicitar per-
missão para falar e comunicar àqueles cavalheiros minha
opinião sobre o particular”, registrou Hitler sobre o acon-
tecimento. E ele o fez com tanta fúria – ou “êxito”, nas suas
palavras – que “antes de concluir o meu discurso, o orador
havia fugido do edifício como um cachorro com o rabo
entre as pernas”.
O discurso de Hitler foi tão inflamado que o líder do
Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães
(NSDAP), Anton Dexler, viu em Hitler a pessoa que
buscava para promover o partido. Imediatamente, apro-
ximou-se do cabo e disse, à queima-roupa, que as portas
do partido estariam abertas a alguém com uma oratória
tão surpreendente quanto a dele. Hitler não respondeu de
imediato, mas, alguns dias depois, foi à sede do partido e
se afiliou. Não só isso. Ele passou a se dedicar de corpo e