Women's Health - Brasil - Edição 118 (2019-08)

(Antfer) #1
Introdução ao prazer
Durante a adolescência, nos ensinam os nomes e as
funções dos diferentes genitais e, se tivermos sorte,
aprendemos algo além da abstinência, incluindo como
evitar gravidez e doenças sexualmente transmissíveis
(DSTs). Mas qual é uma das muitas coisas que faltam?
Aprender sobre o prazer, principalmente para a mulher.
Por isso não é surpresa que, em uma pesquisa com
mulheres universitárias dos Estados Unidos, quase 30%
delas não tenham conseguido identifi car a localização
correta do clitóris. Alison Ash, estadunidense
especialista em sexo , afi rma que não é apenas a falta de
educação sexual que causa esse desconhecimento. “Os
cientistas não desvendaram a anatomia completa do
clitóris até 1998, décadas depois de terem enviado um
homem à Lua”, conta ela. Os resultados de termos fi cado
em segundo plano aparecem logo que as mulheres
começam sua vida sexual.
Quando fez doutorado em sociologia, Alison estudou a
cultura do sexo casual entre heterossexuais e descobriu
que “muitas mulheres não sabem o que querem ou como
pedir o que desejam”, afi rma ela. “Elas priorizam o que
consideram ser o bem-estar do parceiro.”
Seus dados mostraram que o sexo casual está focado
no homem. Apenas 11% das mulheres tiveram um
orgasmo na primeira vez com um novo parceiro – no
Brasil, estamos um pouco melhor: 48% das leitoras de
WH afi rmam que já tiveram um orgasmo nessa situação.
Pesquisadores da Indiana University (EUA) analisaram
dados da Pesquisa Nacional em Saúde e Comportamento
Sexual, feita nos EUA, que mostraram que essa lacuna
não é apenas um fenômeno da juventude: ele ocorre em
todas as idades. A probabilidade de os homens relatarem
ter um orgasmo num encontro sexual é 27% maior em
relação às mulheres, segundo uma pesquisa publicada na
revista internacional Journal of Sexual Medicine.
Além disso, em muitos relacionamentos
heterossexuais, o orgasmo feminino é visto como um
refl exo não de seu desejo e satisfação, mas, sim, da proeza
e masculinidade do parceiro, segundo um estudo
publicado no Journal of Sex Research. Em parte, esse é o
motivo pelo qual 77% das leitoras de WH (segundo
enquete feita em nosso Instagram) já fi ngiram um
orgasmo com um parceiro: as mulheres heterossexuais
entendem que o que está em jogo não é tanto o nosso
próprio prazer, mas, sim, o ego deles.
Embora seja mais fácil para pessoas que possuem
pênis terem certeza de um orgasmo porque ejacula
sêmen, outro fator é que as mulheres entendem muito
menos do que querem e o que dá prazer a elas. E isso é um
grande problema. Os orgasmos não só melhoram a
imunidade e ajudam a combater o estresse (sim, por
favor!), mas também liberam substâncias químicas que
ajudam na ligação entre os parceiros. Mentir em relação
ao orgasmo pode ser mais fácil no curto prazo, mas com o
passar do tempo os casais perdem uma oportunidade
valiosa de se comunicarem. “Você precisa descobrir do
que gosta e, então, ter coragem sufi ciente para pedir por
isso especifi camente – e pedir várias vezes até que seu
parceiro consiga acertar”, afi rma a terapeuta sexual
Aline Zoldbrod, dos Estados Unidos.

Chamando o dr. Orgasmo
Com tanta ignorância com relação a orgasmos
femininos, poderíamos supor que as agências de
fi nanciamento estariam dispostas a apoiar
cientistas que estejam estudando o problema.
E estaríamos erradas.
Apesar de 43% das mulheres relatarem algum tipo
de disfunção sexual, pesquisas sobre mulheres e
orgasmos são escassas – ou não existem. O National
Institutes of Health, órgão de saúde dos Estados
Unidos, não fi nanciou pesquisas na última década
dedicada à melhora do orgasmo feminino.
As pesquisadoras estão sentindo essa
discrepância diretamente. Como membro adjunto
do corpo docente da University of California (EUA),
a neurofi siologista Nicole Prause afi rma que o
comitê de ética da universidade recusou que ela
conduzisse experimentos para medir as respostas
fi siológicas de casais no momento em que estivessem
fazendo sexo, no laboratório, sem mencionar
objeções específi cas sobre o motivo para o bloqueio
da pesquisa. Após uma década tentando realizar o
experimento na comunidade acadêmica, Nicole
fi nalmente desistiu e fundou a Liberos, um instituto
independente voltado à pesquisa sexual, para
continuar seu trabalho sobre prazer no sexo.
Nicole ressalta que o público está ansioso por esse
tipo de pesquisa. Ela nunca tem problemas em
recrutar participantes para seus estudos.
Recentemente, quando colocou um anúncio na
página da Craigslist para um estudo, ela recebeu
mais de 400 ligações e e-mails em 30 minutos. “O
orgasmo é seguro, livre e acessível. Por que não
iríamos querer fi nanciar uma pesquisa sobre isso?”
Lauren Zimmerman, de 25 anos, doutoranda em
bioengenharia na University of Michigan (EUA),
conhece muito bem esse problema. Seu laboratório é
dedicado ao estímulo de nervos das pernas e
daqueles próximos à genitália para o tratamento de
bexiga hiperativa. O interesse de Lauren despertou
quando ela soube que o estímulo desses mesmos
nervos também poderia ajudar mulheres que não
conseguiam ter orgasmo. Ela recebeu fi nanciamento
para um pequeno estudo piloto a fi m de verifi car se
pequenas quantidades de estímulo elétrico indolor
no nervo tibial, no tornozelo, e em um nervo próximo
ao clitóris poderiam melhorar a capacidade de a

77%


das leitoras


de WH já


fi ngiram
um

orgasmo


com um
parceiro

68 WOMEN’S HEALTH / Agosto 2019

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