Aventuras na História - Edição 228 (2022-05)

(EriveltonMoraes) #1

CAPA


IMAGENS GETT Y IMAGES E WIKIPEDIA COMMONS

“Não consigo me lembrar da data com exatidão,
mas continua sendo o dia mais importante da
minha vida”, confessa. Em seguida, formou-se
professor, lutou na Segunda Guerra Mundial,
passou por um campo de prisioneiros alemão e
residiu na Alemanha Ocidental antes de se enrai-
zar nos Estados Unidos. “A minha mãe e o meu
irmão, que sofreram comigo, que partilharam
comigo seu último pedacinho de pão, e aos quais
eu devo a minha sobrevivência, permaneceram
na vila. Eles não tinham outra escolha senão a de
continuar trabalhando na fazenda coletiva. A
Segunda Guerra Mundial nos separou e o que lhes
aconteceu depois eu não sei”, lamenta.

A AJUDA QUE NÃO CHEGOU
Ucranianos expatriados tentaram denunciar ao
mundo os horrores que atingiam seus compa-
triotas. Em maio de 1933, foi criado o Conselho
Nacional Ucraniano, que planejou e organizou
protestos de rua em Winnipeg, Canadá, e enviou
carta ao presidente dos Estados Unidos, Franklin
Delano Roosevelt. O documento relatava as atro-
cidades e incluía depoimentos de vítimas. Ucra-
nianos residentes em várias cidades europeias
também criaram comitês de ação para denunciar
a fome e enviar ajuda aos f lagelados. Infelizmen-
te, tiveram pouco sucesso.
O Vaticano também foi informado do que se
passava em solo ucraniano. Duas cartas anôni-
mas chegaram até o conhecimento do papa Pio
XI, que ordenou a publicação de ambas no jornal
do Vaticano, L’Osservatore Romano. Uma delas
descrevia o seguinte cenário: “À noite, ou mesmo

com o dia claro, não era possível levar pão para
casa sem escondê-lo. Os famintos paravam essas
pessoas e tiravam o pão de suas mãos, e às vezes
ainda as mordiam ou as feriam com facas. Nun-
ca vi gente com faces tão esquálidas e selvagens,
e corpos tão pequenos envoltos em farrapos”.
No entanto, a Santa Sé se dividiu entre os que
eram favoráveis ao envio de ajuda humanitária
à Ucrânia e os que pregavam cautela e discrição
em nome da diplomacia. A posição do segundo
grupo preponderou. A Inglaterra também se
absteve de qualquer interferência. “O governo
britânico não só não ofereceu ajuda como desen-
corajou ativamente os diversos esforços indepen-
dentes para conseguir alimentos para os famin-
tos em 1933, alegando que o governo soviético
se opunha a tais esforços e, por conseguinte, era
ingênuo fazê-los”, relata Anne.
Não haveria como um evento dessa magnitu-
de não impactar as gerações seguintes, acirrando
rivalidades e orientando posicionamentos. Para
Liebel, a memória da fome deixou marcas pro-
fundas na coletividade ucraniana, assim como
as medidas soviéticas de repressão. “Ao mesmo
tempo que conformou boa parte da pop ulação
quanto ao domínio soviético, fez com que outros
vivessem uma resistência que os levou a colabo-
rar com os nazistas quando o território foi do-
minado pelos alemães durante a Segunda Guer-
ra Mundial. Pode-se dizer ainda que fomentou
no subterrâneo um nacionalismo ucraniano que
permaneceu vivo durante toda a Guerra Fria e
que só encontrou campo para se manifestar após
a queda da URSS, em 1991.”

ENQUANTO PARTE DA UCRÂNIA SE CONFORMAVA COM
O DOMÍNIO SOVIÉTICO, OUTRA VIVIA UMA RESISTÊNCIA QUE
A LEVOU A COLABORAR COM NAZISTAS NA II GUERRA

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