Clipping Jornais - Banco Central (2022-05-15)

(Antfer) #1
Banco Central do Brasil

Jornal Folha de S. Paulo/Nacional - Ilustrada
domingo, 15 de maio de 2022
Banco Central - Perfil 1 - Reforma trabalhista

forte que mesmo hoje, quando lidera todas as
pesquisas, há menos empresários dispostos a declarar
voto no petista que em 2002, quando o PT ainda era
temido pelo radicalismo.


Continua na pág. C11


Os cabelos estão mais ralos e brancos, a voz mais
rouca. Como um jogador de futebol depois de longa
inatividade, está enferrujado. As declarações saem
tortas, como chutes a esmo para o gol


É impossível compreender o Lula de 2022 sem a
socióloga Rosângela da Silva, a Jan-ja, com quem tem
casamento marcado nesta semana. Vinte e um anos
mais jovem, Janja é onipresente nas falas de Lula: nos
discursos ('vocês têm que saber que um cara que tem
76 anos e está apaixonado só pode fazer o bem para
esse país'), nas entrevistas ('estou apaixonado como se
fosse minha primeira namorada') ou mesmo nas
broncas ('eu podia estar com a Janja e estou aqui'). Ela
incorporou questões de raça, gênero e meio ambiente
ao discurso lulista.


Janja acompanhou de perto o flerte secreto que
desaguou na maior novidade da campa -nha, o convite
para que Geraldo Alckmin fosse candidato a vice do
antigo adversário da eleição de 2000. Nos meses de
conversas com Alckmin, Lula retomou sua característica
mais marcante e menos compreendida na militância
petis-ta, a busca do acordo.


Acostumado aos tempos poderosos da Presidência,
Lula subestimou a resistência do PT ao convite a
Alckmin. Militante petista desde os anos 1980, Janja foi
quem mostrou que a chegada cie Alckmin precisava ser
compensada com um discurso para agradar a esquerda.
Por isso, Lula passou as últimas semanas chamando
Bolsonaro de 'fascista' e defendendo a revisão da
reforma trabalhista.


Na biografia política "Lula and His Politics of Cunning'
(Lula e sua política de astúcia), John D. French ressalta
como a formação sindical foi a espinha dorsal do estilo
Lula. O historiador americano argumenta que, como


sindicalista sob o AI-5, Lula foi forjado em um ambiente
de tensão em que era preciso abrir portas de diálogo
com os adversários. Para quem negociou greves com
generais, chamar Alckmin de 'companheiro' é simples.
Como dizia Tancredo Neves, outro líder de uma frente
ampla, 'ninguém vaiao Rubicão para pescar'.

A volta é sempre um risco. Napoleão Bonaparte durou
cem dias no seu retorno após fugir da ilha de Elba. Já
Winston Churehill, acossado por duas décadas pelo
fracasso militar no estreito de Dar-danelos, na Primeira
Guerra, era o símbolo de perdedor até se tornar
primeiro-ministro do Reino Unido em 1940 e enfrentar
Adolf Hitler.

No Brasil, Juscelino Kubits-chek acreditava que o golpe
de 1964 lhe daria a chance ae uma nova disputa
presidencial, mas nunca voltou ao poder. Leonel Brizola,
por sua vez, voltou, mas seu lugar de líder popular foi
tomado pelo proprio Lula.

Existe um tom de tragédia grega no retorno de Lula à
campanha eleitoral, 16 anos depois de sua última
disputa, 12 anos depois de sair consagrado da
Presidência, seis anos depois do impeachment e quase
três anos depois de sair da cadeia.

Lula volta à política como um Ulisses, que chega
irreconhecível à Itaca depois de anos de guerra e
naufrágios. Na 'Odisséia' de Homero, o reino estava
tomado pelos pretendentes ao trono e à cama da rainha
Penélope.

Ulisses os derrota porque só ele consegue manejar o
velho arco e flecha que deixara ao partir para a Guerra
de Troia. Em 2022, Lula tentará provar que ele é o único
candidato capaz de dobrar o arco das vontades
populares. De novo.

Assuntos e Palavras-Chave: Banco Central - Perfil 1 -
Reforma trabalhista
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