National Geographic - Portugal - Edição 223 (2019-10)

(Antfer) #1

76 NATIONALGEOGRAPHIC


Aindaa bordodanauqueostrouxea casa,JuanSebastiánElcanoescreveuma
cartaaoimperadorCarlosV,comquemnuncaimaginaracorresponder-se.
Registalinhassóbriasque,comdificuldade,refreiama emoçãodomomento.
Nelas,dáa primeiranotíciadarealidadequemudariaa concepçãodomundo:
“SaibaVossaMajestadequedemosa voltaa todaa redondezdomundo.”
RecuemosatéaofimdeAbrilde1521.Faltaumanoe meioparaesteglo-
riosomomento.Muitotempo,muitomundoe muitasmortesaindaocorre-
riam.AmortedocomandanteFernãodeMagalhães,naabsurdabatalhade
ilhadeMactán,nãofoicertamentea primeira,masfoia maiscontundente.
O seusonhodeatingirasMolucasporocidenteculminoumuitoa nortedas
almejadasilhas,nasFilipinas,territóriodesconhecidonaEuropa.Numa
tentativadedarcontinuidadeaoprojecto,DuarteBarbosa,seucunhado,e
JoãoSerrão,sãonomeadoscomandantesdamalfadadaexpedição,masnão
por muitotempo.Avitóriadosautóctonescontraosestrangeiros(ainda
hojecomemoradanasFilipinas)nãosóosprivoudolíder,mastambémde
algo muito mais valioso: a sua aura de invulnerabilidade.
No dia 1 de Maio, uma semana apenas após a morte de Magalhães, o pe-
saroso Humabón, rajá da ilha de Cebu, organiza um jantar de homenagem
para o qual convida os principais comandantes da expedição: pilotos, co-
mandantes, mestres e contramestres. Exprime as suas condolências e ob-
sequia-os com riquíssimos presentes para o distante e todo-poderoso rei
Carlos, mas já decidiu que a aliança com aqueles estrangeiros não pode du-
rar. A entrega dos presentes é o sinal para a emboscada. João Carvalho, que
chega tarde e repara em algo de suspeito, dá o alerta e é o único a alcançar
os navios. Os restantes 26 oficiais superiores da expedição são brutalmen-
te assassinados pelos homens de Humabón, escondidos na floresta densa.
O notável Antonio de Pigafetta, autoproclamado cronista da expedição, e
Juan Sebastián Elcano, mestre da nau Concepción, não se encontram entre
os mortos. Os problemas de saúde que os impediram de desembarcar para
assistir à homenagem prestada pelo chefe local salvam-lhes a vida. Fazem-
-se ao mar com os restantes sobreviventes e só param na ilha de Bohol, onde
se vêem obrigados a queimar a nau Concepción por não terem tripulantes
suficientes para manobrá-la. São 115 os homens que preferem reduzir a cin-
zas um dos seus navios a vê-lo cair em mãos inimigas.


TEXTO DE EMMA LIRA

No dia 6 de Setembro de 1522,


no cais de Sanlúcar de Barrameda,


um punhado de sobreviventes


derrama lágrimas de emoção ao


encontrar-se de novo na terra


deixada para trás três anos antes.


Um apêndice à “Relação
da Primeira Viagem
ao Redor do Mundo”,
de Antonio de Pigafetta,
mostra o mapa com
“as cinco ilhas onde
cresce o cravo e a sua
árvore”. A demanda
de uma rota alternativa
por ocidente até às ilhas
Molucas para negociar
o valioso cravo-da-índia
foi o motor da
expedição que daria
a volta ao mundo.
AKG/ALBUM

PÁGINAS SEGUINTES
Pescadores regressam
ao porto com peixe
capturado na ilha de
Palawan, nas Filipinas.
Após a morte de
Magalhães, a frota
desembarcou em Palawan
e os abundantes recursos
da ilha salvaram a vida
aos tripulantes. Antonio
de Pigafetta, cronista da
expedição, chamou “terra
prometida” àquele lugar.
CEGALERBA/ SZWEMBERG/HEMIS / GTRES
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