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caça furtiva. As girafas não conseguem saltar so-
bre as vedações, o que signifi ca que os seus ter-
ritórios se fragmentam”, comenta Arthur Mu-
neza, coordenador da GCF na África Oriental.
O crescimento demográfi co humano, o sobre-
pastoreio do gado e as alterações climáticas es-
tão a empurrar os pastores e os agricultores para
as zonas húmidas e para os habitats das girafas.
Enquanto isso, o decréscimo da população de
girafas-núbias, na sua maioria residentes no
Uganda, chegou a atingir 97% ao longo dos últi-
mos 30 anos, tornando-se um dos grandes ma-
míferos mais criticamente em perigo do mundo.
As girafas do Níger são ainda mais raras e, no
entanto, a partir do seu efectivo mais baixo (ape-
nas 49 indivíduos em 1996), a população recupe-
rou, crescendo para 600 indivíduos nos últimos
25 anos. Esta recuperação é uma das mais bem-
-sucedidas histórias de conservação do conti-
nente e também uma das mais improváveis.
O Níger ocupa a última posição entre os 189
países do Índice de Desenvolvimento Humano
das Nações Unidas, uma lista que avalia a espe-
rança de vida, o ensino e os rendimentos nacio-
nais. A protecção da vida selvagem não é, natu-
ralmente, uma das prioridades tradicionais do
país. Em 1996, após um golpe de Estado, o novo
presidente do Níger, Ibrahim Baré Maïnassara,
enviou o exército para o mato para capturar um
grupo de animais e oferecê-lo como presente
aos presidentes dos países vizinhos da Nigéria e
Burkina Faso. Nenhuma girafa capturada sobre-
viveu à operação e a população de girafas nige-
rinas diminuiu quase um terço. Três anos mais
tarde, outros dois animais morreram quando o
presidente seguinte tentou enviar um presente
ao chefe de Estado do Togo.
Esta situação dramática e o reconhecimen-
to de que as últimas girafas nigerinas eram
um recurso de vida selvagem raro, num país
com poucos recursos naturais, levou o Níger
a desenvolver, em 2011, a primeira estratégia
nacional de conservação de África, com o in-
tuito de proteger as girafas. Com a caça furtiva
quase erradicada pelo governo e sem quaisquer
predadores naturais, a população de girafas de
Koure aumentou. Perante uma taxa de cresci-
mento superior a 11% por ano, os confl itos com
os agricultores e pastores pareciam inevitáveis.
Era evidente que os números continuariam a
subir e que seria necessário criar uma segunda
população satélite noutro local, para manter as
girafas saudáveis.EM 2016, UMA EQUIPA DE CIENTISTAS teve uma
epifania (embora discutível) sobre as girafas. Até
então, a opinião convencional defendia que todas
as girafas pertenciam a uma única espécie, a
Giraff a camelopardalis. No entanto, análises gené-
ticas sugerem agora que as girafas são, na verdade,
quatro espécies distintas, bem mais diferentes
entre si do que aquilo que separa o urso-pardo do
urso-polar. Essas quatro espécies podem ainda
ser classifi cadas em cinco subespécies, incluindo
a rara Giraff a camelopardalis peralta, da África
Ocidental – os raros refugiados malhados que
actualmente só existem na região de Koure, no
Níger. Com base nesta nova taxinomia, todas as
subespécies, com excepção de duas, seriam con-
sideradas vulneráveis, em perigo ou criticamente
em perigo e, em toda a África, as populações dimi-
nuíram quase 40% nas últimas três décadas. Cal-
cula-se que existam 110 mil girafas no mundo.
Julian Fennessy, co-director da Giraff e Con-
servation Foundation (GCF), designa este ce-
nário como a “extinção silenciosa” porque, ao
contrário da atenção dispensada ao desapare-
cimento dos elefantes e dos grandes símios,
a maioria das pessoas presume que as girafas
abundam na natureza, talvez por existir um
número tão abundante de exemplares em jar-
dins zoológicos e reservas e pela proliferação de
girafas de peluche.
Com efeito, a situação das girafas é excelente
em algumas regiões de África. Na África do Sul
e na Namíbia, onde as reservas de caça priva-
das contribuem para o aumento do número dos
animais e as girafas são caçadas legalmente, as
populações quase duplicaram nas últimas dé-
cadas. Na África Oriental, porém, o cenário de
duas espécies de girafa (a reticulada e a masai),
é bem mais sombrio. “As vedações são o princi-
pal factor de morte de girafas no Sul do Quénia.
Elas representam uma ameaça maior do que a
NA ÁFRICA DO SUL
E NA NAMÍBIA, A SITUAÇÃO
DAS GIRAFAS É EXCELENTE.
NA ÁFRICA ORIENTAL, PORÉM,
O QUADRO DE DUAS ESPÉCIES
DE GIRAFA, A RETICULADA E A
MASAI, É BEM MAIS SOMBRIO.