Robôs humanos
Banco Central do Brasil
Jornal Folha de S. Paulo/Nacional - Opinião
terça-feira, 24 de maio de 2022
Cenário Político-Econômico - Colunistas
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Há algo de podre no reino das redes sociais. Num
ambiente em que o número de seguidores, curtidas,
comentários e compartilhamentos constitui a medida de
todas as coisas, vê-se que empresas inflam
artificialmente o "engajamento" de seus clientes por
meio de contas falsas em plataformas como TikTok,
Facebook e Instagram.
Esses perfis inautênticos são controlados por pessoas
que, atraídas por promessas de ganhos extras, chegam
a gerir até 500 contas diferentes, convertendo-se em
verdadeiros "bots" (ou robôs) humanos.
Trata-se de uma prática que, obviamente, gera
percepções falsas de relevância e repercussão.
Uma quantidade maior de curtidas ou seguidores
termina por trazer mais visibilidade àqueles que
contratam o serviço, como celebridades e políticos,
chamando a atenção de marcas interessadas em
patrocinar os perfis e fazendo com que estes sejam
privilegiados pelos algoritmos das redes, num ciclo que
se retroalimenta.
Ações do tipo violam os termos de uso da maioria das
redes sociais que, ao detectarem-nas, costumam
suspender ou bloquear os perfis falsos. Há, contudo,
uma miríade de truques circulando pela internet para
fazer com que as contas pareçam autênticas e
consigam driblar as punições que a manipulação
artificial pode acarretar.
A fim de compensar os baixos rendimentos recebidos, já
que o pagamento por interação varia de R$ 0,001 a R$
0,05, os usuários são incentivados a criar múltiplas
contas. Para tanto, valem-se de softwares oferecidos
pelas próprias empresas que os contratam.
Tais recursos permitem ações de forma automatizada -
ampliando, assim, o alcance da fraude.
Os números desse mercado são desconhecidos, mas
um estudo recente oferece alguns indícios de sua
magnitude a partir da quantidade de acessos individuais
às principais plataformas de cliques.
Em junho de 2021, a Dizu teve 1,3 milhão de visitantes
únicos, seguida da GanharNoInsta, com 1,2 milhão, da
SigaSocial (276 mil), da Kzom (190 mil) e da Everve (67
mil).
Embora inexistam no país leis que vedem a
comercialização desse impulsionamento artificial, a
situação pode mudar caso a Lei das Fake News venha
a ser aprovada pelo Congresso -uma vez que o projeto
de lei estabelece regras que buscam obstar o
funcionamento de contas falsas nas redes.
Mas é difícil acreditar que uma lei possa ter alcance
amplo se as próprias redes não agirem de forma mais
decidida contra o problema.
COLUNISTAS
Assuntos e Palavras-Chave: Cenário Político-