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quarta-feira, 25 de maio de 2022
Cenário Político-Econômico - Colunistas

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Autor: Maria Fernanda Rodrigues


Quando a casa se desfaz


no começo de Quando as Árvores Morrem, a narradora
relembra uma história do passado vivida em uma de
suas voltas para casa - uma casa, ela diz, 'que nunca
mais será casa depois de um de nós ter partido'.
Lembro de um poema de José Luiz Peixoto, Na hora de
pôr a mesa, que está em A Criança em Ruínas
(Dublinense) - sobre uma família de cinco, que se
manterá dessa forma, com cinco pratos (em algum
momento imaginários) à mesa, enquanto um deles
estiver vivo.


O romance de estreia de Tatiana Lazzarotto é sobre
casas e famílias, árvores e raízes, mortes e recomeços,
memórias e despedidas - de pessoas, de lugares, da
infância. Quando as Árvores Morrem é um luto. Um livro
sobre um pai que é um mundo - que se desfaz de
repente.


O alerta no início diz que esta é uma obra de ficção com
alguns episódios e personagens baseados em fatos


reais. Foi escrito na pandemia, pouco tempo depois de
a autora perder seu pai, e acompanha essa narradora,
que volta para a cidade de sua infância para o enterro
deste pai que morreu repentina e precocemente.

Uma cena contada com raiva pela personagem me
comove. Uma fila de crianças aparece no velório. Cada
uma com um envelope na mão - que são depositados
numa lata de biscoito. Elas não têm altura para ver
dentro do caixão - nem idade -, mas a imagem no
quadro ao ado confirma: o Papai Noel morreu. A um
mês do Natal. Sim, o pai da narradora, e da autora, foi
um conhecido Papai Noel que ganhou a vida como o
bom velhinho no sul do País. Vestiu tanto o personagem
que, na frente da casa que ele enfeitava sem discrição
no fim do ano, havia uma caixa de correspondência
para receber o pedido das crianças. Ele também
ganhou um selo especial dos Correios e até conseguiu
registrar a marca e se tornar o Papai Noel do Brasil.

Acompanhamos os dias que se seguem ao enterro
intercalados com as memórias carinhosas que a filha
guarda deste homem, que ela nos apresenta em toda
sua alegria, sonhos, projetos e esperança de que o
novo ano seria, enfim, o ano deles. Um homem que se
equilibrava e desequilibrava financeiramente. Que deixa
um segredo. Que foi o alicerce desta família de cinco
agora às voltas com toda uma vida que se vai para
debaixo da terra, com as caixas de mudança e doação,
com a casa e a árvore que os abrigou.

Quando as Árvores Morrem é uma longa despedida.
Uma filha juntando os cacos, preservando uma boa
imagem de seu pai e tentando se entender com sua
nova condição de órfã, de adulta.

JORNALISTA ESPECIALIZADA EM LITERATURA

COLUNISTAS

Assuntos e Palavras-Chave: Cenário Político-
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