Mais um calote premiado
Banco Central do BrasilJornal O Estado de S. Paulo/Nacional - Metrópole
quinta-feira, 26 de maio de 2022
Cenário Político-Econômico - ColunistasClique aqui para abrir a imagemConsolidando uma tradição deletéria da política nacional
em ano eleitoral, o Senado aprovou uma anistia
generalizada a devedores dos cofres públicos, no caso
aos inadimplentes do Fundo de Financiamento
Estudantil (Fies). Todo mundo ganha - os inadimplentes;
os políticos, que oferecem mais um pacote de bondades
a um nicho eleitoral; as universidades, que já tiveram
suas mensalidades pagas -, exceto o contribuinte, que
arca com os custos, e aqueles beneficiários que se
sacrificaram para honrar em dia seus compromissos.
O problema das dívidas estudantis não é peculiaridade
do Brasil. Nos EUA, por exemplo, ele suscita debates
inflamados. Mas a inadimplência crônica do Fies em
particular, que agora tenta ser remediada com uma
medida populista, é ela mesma um típico produto de
políticas demagógicas.
Durante a gestão petista, o programa, criado pelo
governo FHC, foi engordado, com regras cada vez mais
frouxas de concessão de empréstimos, chegando a
beneficiar muitos estudantes de alta renda. Previsi-
velmente, a inadimplência explodiu, e foi agravada pela
recessão fabricada pela irresponsabilidade fiscal do
governo Dilma Rousseff A taxa de inadimplência
ultrapassa 50%: mais de 1 milhão de inadimplentes,
cujas dívidas chegam a R$ 6,6 bilhões.O problema podería suscitar reformas para
eventualmente ampliar o número de bolsas a
estudantes pobres ou cotas sociais em universidades
públicas. Para os atuais inadimplentes, e com vistas aos
futuros, podería se planejar negociações focalizadas e
programas de amortização condicionados à renda.Mas a solução do governo Jair Bolsonaro, como tudo o
mais em suas políticas educacionais, foi reativa, inepta
e demagógica. No fim de 2021, Lula da Silva defendeu
uma anistia geral. Ato contínuo, Bolsonaro editou a
medida provisória agora aprovada pelo Congresso.A medida beneficia os alunos que aderiram ao
programa até 2017. Aqueles com débitos vencidos há
mais de 90 dias da publicação da medida podem ter
desconto de até 12% no pagamento à vista, ou parcelar
o débito em 150 meses, com perdão de juros e multas.
Quando o débito ultrapassar 360 dias, os descontos
chegam a 77%. Para os inscritos no Cadastro Único
para Programas Sociais, o abatimento chega a 99%.Como toda medida demagógica, essa ameaça
gravemente a sustentabilidade de um importante
programa de inclusão social. Com a solução preguiçosa
e eleitoreira do governo e do Congresso, é previsível
uma chuva de ações judiciais por parte daqueles que
pagaram em dia, pedindo os mesmos descontos. Mais
grave, o perdão indiscriminado passa um recado aos
beneficiários desse e outros programas de crédito
(como o Refis) de que honrar suas dívidas pode ser
bom para a consciência, mas é mau negócio. Melhor
esperar a próxima anistia, que seguramente virá no
período eleitoral.Em troca de votos, os atuais mandatários contribuem
mais uma vez para cimentar a cultura do calote. A
cortesia é com chapéu alheio: quem paga a conta é o
contribuinte. Espera-se que, enquanto eleitor, ele não