Clipping Revistas - Banco Central (2022-05-28)

(Antfer) #1
Banco Central do Brasil

Revista Carta Capital/Nacional - Seu País
sexta-feira, 27 de maio de 2022
Banco Central - Perfil 1 - Ministério da Economia

O fechamento dos bingos provocou a reação de
diversos empresários que alegavam explorar o filão de
forma lícita e com as obrigações legais em dia. Essa
polêmica fez com que tivesse início no Congresso a
discussão sobre a legalização dos jogos, que agora
depende do Senado para ser concluída. As dúvidas de
duas décadas atrás permanecem. “A sociedade precisa
discutir se é vantajoso criar uma nova esfera com
potencial risco de atividade criminosa”, afirma o
advogado Michael Mohallem, consultor da
Transparência lnternacional Brasil. O vício em apostas,
lembra, faz parte do Código Internacional de Doenças
estabelecido pela OMS e o projeto permite o
desenvolvimento de atividades novas ou banidas do
País. “Partes dessas atividades são reconhecidas como
crimes ou contravenções penais. São, inclusive,
controladas por agentes atuando de forma ilegal. Nesse
sentido, o projeto amplia significativamente as
atividades com as quais pode haver associação para a
prática de crime, sem que se faça um processo
incrementai ou paulatino de inserção.”


O ex-deputado federal Wadih Damous lembra o
precedente dos bingos e avalia como “inevitável” a
participação do crime organizado se um novo modelo
legal para os jogos de azar for aprovado: “Cassino é o
tipo de negócio que, por trabalhar com dinheiro vivo
utilizado nas apostas, atrai o dinheiro ilícito ou lavado de
uma forma em que fica muito difícil o rastreamento.
Alguns segmentos da criminalidade brasileira têm com
esse cenário de legalização um prato feito para a
lavagem e sonegação de impostos”. Os perigos vão
além dos crimes financeiros, pois, no Brasil, os
“empresários da contravenção” sempre tiveram estreita
ligação com o tráfico de drogas e armas e foram vetores
da corrupção policial.


Segundo o Ministério Público, os antigos banqueiros do
bicho, agora substituídos pelos modernos chefões da
máfia dos caça-níqueis, são mantenedores da “habitual
e permanente corrupção de agentes públicos”,
sobretudo policiais civis e militares. Essa relação
resvala para os grupos de extermínio, fato mais uma


vez comprovado com a Operação Calígula, que revelou
a sociedade de Rogério Andrade com o ex-policial
Ronnie Lessa, apontado como o executor da vereadora
Marielle Franco. “Em se tratando de um projeto de lei
bolsonarista, dificilmente haverá salvaguardas quanto à
possibilidade de utilização desses bingos e cassinos
pelo crime organizado e pelas milícias”, diz Damous.

Estudioso do crime organizado no 5 Brasil, o sociólogo
Ignacio Cano concorda não ser possível ter garantias de
que a legalização dos jogos não seja usada para lavar
dinheiro, mas faz uma ressalva: “Alavagem de dinheiro
não será inaugurada pela legalização, ela já acontece.
O “ crime organizado lava dinheiro. Então, ~ acho
importante a descriminalização de bingos, cassinos e
jogo do bicho. Na medida em que forem atividades
legais, se- % rá possível exercer uma supervisão”, diz. ’
Cano acrescenta que, enquanto permanecerem ilegais,
“os jogos continuarão a g ser organizados através da
corrupção por um lado e da violência por outro”. O
professor da Uerj rebate ainda o “motivo supostamente
moral” de evitar a ludopatia. “Seria a mesma coisa que
proibir o álcool porque existem alcóolatras ou proibir os
carros porque há gente que provoca acidentes de
trânsito.”

Deputados governistas afirmam que há no texto
aprovado salvaguardas para evitar a entrada do crime
organizado. Entre elas, o fato de os futuros donos de
cassinos e bingos terem de passar pelo crivo do
Ministério da Economia. Além disso, o projeto veda a
participação de condenados pelos crimes de sonegação
fiscal, corrupção, concussão e improbidade
administrativa, entre outros. Vale lembrar, no entanto, o
histórico e farto “laranjal” da contravenção. “Não vejo
como um forasteiro sobreviverá em um universo no qual
os atuais chefes certamente vão se organizar em
empresas, montando consórcios laranjas para seguir
operando sob um manto de legalidade”, disse Cláudio
Ferraz, que chefiou a Delegacia de Repressão ao Crime
Organizado no Rio de Janeiro, ao jornal O Globo.
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