Público - 01.11.2019

(Ron) #1

18 • Público • Sexta-feira, 1 de Novembro de 2019


SOCIEDADE


A mudança de parecer do Instituto da
Conservação da Natureza e das Flo-
restas (ICNF) entre o primeiro e o
segundo Estudo de Impacte Ambien-
tal (EIA), a localização do aeroporto
numa das freguesias da Área Metro-
politana de Lisboa mais vulneráveis
às alterações climáticas, e o recorde
de tráfego de passageiros no aeropor-
to da Portela que, pela primeira vez,
teve mais de 30 milhões em 12 meses
consecutivos, podem colocar em cau-
sa a proposta de Declaração de
Impacte Ambiental (DIA) apresentada
pela Agência Portuguesa do Ambien-
te (APA).
A aparente mudança de posição do
ICNF do primeiro para o segundo
Estudo de Impacte Ambiental, pode
mesmo ser usada pela associação
ambientalista Zero na batalha jurídica
contra o procedimento ambiental.
Em declarações ao PÚBLICO, Carla
Amado Gomes, professora de Direito
do Ambiente da Faculdade de Direito
da Universidade de Lisboa diz que, “a
conÆrmar-se este vício, pode invali-
dar a Declaração de Impacte Ambien-
tal”.
No parecer ao primeiro EIA, que
acabou por ser declarado “não con-
forme” pela APA, levando à elabora-
ção de um segundo estudo, o ICNF
defendeu a obrigatoriedade de o pro-
jecto fazer “o exame de soluções
alternativas”, nos termos do regime
jurídico da Rede Natura 2000 (artigo
10.º, n.º 6, alínea d), tendo em conta
que o aeroporto do Montijo Æca loca-
lizado na proximidade imediata da
Zona de Protecção Especial (ZPE) do
Estuário do Tejo e que, sendo exigível
uma Avaliação de Incidência Ambien-
tal, teriam de ser estudadas “as solu-
ções alternativas (de localização ou
de layout)”.
O segundo parecer, em que o
ICNF viabiliza o segundo EIA, não é
ainda publicamente conhecido, mas
neste último documento continuam


O Instituto da Conservação da Natureza e


das Florestas terá deixado de exigir o


estudo de soluções alternativas ao


aeroporto do Montijo. E isso pode dar


armas aos ambientalistas em tribunal


Onde vão ser gastos os
48 milhões para compensar
o impacto do novo aeroporto?

POTECÇÃO
DA AVIFAUNA

TAXA APLICADA
A CADA VOO

milhões

euros

Valor
ainda
incerto

7, 2


4,


MITIGAÇÃO
DO RUÍDO

milhões

15 a 20


MOBILIDADE

milhões

até 10


A APA quer que a população que vai
ser afectada pelo ruído causado pelo
novo aeroporto seja compensada “na
forma de apoio financeiro a medidas
de isolamento acústico” em casas
particulares e edifícios públicos.

Novos acessos à Ponte Vasco da
Gama terão de ser construídos (não
há valores apresentados) e a ANA
terá de assegurar a aquisição de dois
barcos para a Transtejo.

Prevê-se a constituição de um
mecanismo financeiro gerido pelo
Instituto de Conservação da Natureza
e Florestas que compense o impacto
nas aves do estuário do Tejo.

Há 200 condições ao todo, entre
elas: proibição do tráfego aéreo entre
a meia-noite e as 6h, o
condicionamento de voos entre as
23h e meia-noite e entre as 6h e as
7h, a adopção de procedimentos de
aterragem e descolagem menos
ruidosos e a implementação de um
plano de redução de emissões de
gases com efeito de estufa.

(mais 200
mil anuais)

Fonte: Agência Portuguesa do Ambiente PÚBLICO

OUTRAS
MEDIDAS

sem ser estudadas as “soluções
alternativas” que a lei impõe, e que
o ICNF exigia, pelo que a diferença,
neste aspecto, estará na posição do
instituto.
“Aguardamos conhecer o parecer
do ICNF para conÆrmar que houve
violação da lei”, disse ontem ao
PÚBLICO Acácio Pires, da associação
ambientalista, que vai reforçar a quei-
xa que já apresentou em Bruxelas,
por violação da legislação comunitá-
ria e está a ponderar avançar com
uma providencia cautelar para travar
o projecto. Entre os dois pareceres, o
ICNF, que é autoridade em matéria
ambiental, com poder vinculativo,
mudou de presidente.

Risco de cheias
A localização do aeroporto do Monti-
jo numa das freguesias da Área Metro-
politana de Lisboa mais vulneráveis
às alterações climáticas é, por outro
lado, um sinal contrário ao espírito
do Plano Metropolitano de Adaptação
às Alterações Climáticas (PMAAC) que
a Área Metropolitana de Lisboa con-
cluiu recentemente e que tem apre-
sentação pública marcada para 6 de
Dezembro.
Segundo o capítulo do PMAAC que
estuda os “impactes e vulnerabilida-
des climáticas nas zonas costeiras e
de mar”, a Freguesia de Montijo e
Afonsoeiro é uma das três que apre-
sentam mais elevados “índices de
vulnerabilidade futura a inundações
estuarinas” e de “susceptibilidade ao
risco”, actual e futura, conforme o
Volume II e Volume II – Anexo, con-
sultados ontem pelo PÚBLICO.
O mesmo estudo aponta ainda o
Montijo e Afonsoeiro como uma das
freguesias da AML com “índices de
vulnerabilidade actual e futura a
cheias rápidas” no estuário do Tejo.
Na fase Ænal do decurso do procedi-
mento de elaboração do EIA agora
avaliado, o Aeroporto da Portela vivia
o período de maior lotação da sua
história. De acordo com a Vinci Airo-
ports, empresa detentora da ANA
Aeroportos, em Março de 2019, o

Aeroporto do Montijo


Francisco Rito


ICNF deu luz verde sem que


fossem estudadas alternativas


Onovo aeroporto do Montijo está a ser alvo de contestação

DANIEL ROCHA
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