Público - 01.11.2019

(Ron) #1

32 • Público • Sexta-feira, 1 de Novembro de 2019


MUNDO


Câmara dos Representantes


formaliza impugnação de Trump


Seja qual for o resultado dos esforços
do Partido Democrata para acusar o
Presidente Donald Trump de crimes
puníveis com o afastamento do cargo,
a votação de ontem na Câmara dos
Representantes já garantiu um lugar
na História. Com uma maioria de 232
votos contra 196, os congressistas
aprovaram as regras para a próxima
fase do processo de impeachment
(impugnação) de Trump, que abre as
portas a audições em público — é a
quarta vez em 230 anos que o Con-
gresso chega tão perto de acusar um
Presidente dos Estados Unidos.
A aprovação já era esperada, graças
à maioria de 233 congressistas que o
Partido Democrata tem na câmara
baixa do Congresso. Mas os números
são importantes em processos como
este, para se avaliar até que ponto
cada partido está disposto a afastar o
Presidente da Casa Branca, ou a cer-
rar Æleiras à volta dele — e, pelo que
se viu, não há sinais de que um dos
lados esteja perto de aceitar os argu-
mentos do outro.
No Twitter, o Presidente voltou a
acusar o Partido Democrata de que-
rer afastá-lo a qualquer preço: “É a
maior caça às bruxas na história ame-
ricana!”
Na prática, a votação tira o proces-
so de uma fase que tem sido conduzi-
da à porta fechada, no último mês, e
que serviu para que três comissões
da Câmara dos Representantes ouvis-
sem, até agora, 15 testemunhas. O
Partido Republicano, também repre-
sentado nessas comissões, acusa os
democratas de quererem esconder o
processo do grande público.
Para contornar essa acusação, o
Partido Democrata decidiu iniciar
uma nova fase, com audições em
público de algumas das testemunhas
já ouvidas à porta fechada, e cujos
depoimentos vão chegar, pela primei-
ra vez, a muitos eleitores.
Ainda que o Partido Republicano
passe a ter a oportunidade de convo-
car as suas próprias testemunhas para
defenderem o Presidente, as regras
deÆnidas pelo Partido Democrata não
foram bem recebidas pela oposição.


Processo entra numa nova fase, com audições em público a testemunhas que acusam o Presidente


norte-americano de pressionar a Ucrânia a investigar Joe Biden, seu adversário político


Na proposta, Æca claro que os repu-
blicanos só vão poder fazer aquilo
que a maioria do Partido Democrata
deixar — o que é habitual nas comis-
sões do Congresso, onde um dos par-
tidos tem mais representantes do que
o outro, mas que o Partido Republi-
cano considera ser injusto no caso da
impugnação do Presidente Trump.
Ainda antes de o processo entrar
na segunda fase, os depoimentos à
porta fechada prosseguiram ontem
com a presença de Timothy Morri-
son, principal conselheiro sobre a
Rússia e a Europa no Conselho de
Segurança Nacional dos EUA.
Segundo o jornal Washington Post,
Morrison corroborou uma das acusa-
ções mais graves contra o Presidente
Trump desde o início do processo de
impugnação, feita pelo embaixador
interino dos EUA em Kiev, William
Taylor. Morrison admitiu que alertou
Taylor para a existência de um plano

TOM BRENNER/REUTERS

“É a maior caça às bruxas da história americana”, disse Trump

Ontem, Bolton foi convidado a
depor à porta fechada. O seu advoga-
do disse que o antigo responsável só
admite comparecer se for intimado.
Se isso acontecer, Bolton poderá
recorrer aos tribunais para que digam
qual das ordens deve ele cumprir:
comparecer nas audições por ordem
do Congresso, ou faltar por ordem da
Casa Branca.

Longe da destituição
Há duas maneiras de olhar para o
impeachment de um Presidente dos
EUA, e o caso de Trump não é dife-
rente. Para quem quer saber se
Trump está mais perto de ser afasta-
do da Casa Branca, a resposta é não.
Mesmo que a Câmara dos Represen-
tantes venha a acusar o Presidente de
“crimes graves ou delitos menores”,
como diz a Constituição, é provável
que Trump não seja condenado por
essa acusação quando o processo
subir ao Senado. A condenação só
acontece com maioria de dois terços
(67 senadores), e o Partido Democra-
ta só conta com 47 votos.
Mas se o objectivo é tentar perce-
ber se Trump está mais perto de ser
o terceiro Presidente na História dos
EUA a ser acusado no Congresso de
crimes graves, puníveis com a desti-
tuição, então a resposta é sim.
Com a votação de ontem, a Comis-
são de Justiça da Câmara dos Repre-
sentantes Æca mandatada para espe-
ciÆcar que crimes são esses, e para
pôr uma acusação Ænal a votação
pelos 435 congressistas. Quando esse
momento chegar (o que pode acon-
tecer até ao Æm do ano, segundo a
estimativa da liderança do Partido
Republicano), o Presidente é impug-
nado — o que só aconteceu duas vezes
em 230 anos, a Andrew Johnson
(1868) e a Bill Clinton (1998).
Só então o processo passa para o
Senado, onde deverá ter o mesmo Æm
dos processos de Johnson e Clinton,
ambos acusados, mas não condena-
dos. Richard Nixon, talvez o Presiden-
te norte-americano mais identiÆcado
com o termo impeachment, não che-
gou a ser acusado — resignou em 1974,
quando era certo que iria ser acusado
na Câmara dos Representantes.

[email protected]

EUA


Alexandre Martins


Com o Äm das
audições à porta
fechada, muitos
eleitores vão ouvir
pela primeira vez
as acusações
das testemunhas

na Casa Branca, coordenado pelo
advogado de Trump, Rudolph Giulia-
ni, para reter o envio de quase 400
milhões de dólares em ajuda militar
para a Ucrânia enquanto o Presiden-
te do país, Volodimir Zelenskii, não
anunciasse que iria investigar adver-
sários políticos do Presidente norte-
americano, como Joe Biden.
Ainda mais importante poderá ser
o testemunho de John Bolton, o anti-
go conselheiro de Segurança Nacional
que saiu do cargo em Setembro em
conÇito com o Presidente Trump.
Bolton, um conservador da linha
dura insuspeito de ter ligações ao Par-
tido Democrata, terá dito após uma
reunião com representantes ucrania-
nos, em Julho, que Giuliani estava a
coordenar um plano que parecia “um
negócio de droga”, e que o advogado
de Trump seria “uma granada que vai
matar toda a gente” na Casa Branca.
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