Introdução
Rosália Araújo foi a última criada de António de Oliveira Salazar: entrou em
São Bento em 1965, com quase 14 anos, e de lá saiu, com um interregno, após
a morte do ditador, em 1970. Tinha então 19 anos.
Conheci-a em março de 2012, quando, pela primeira vez me desloquei a
Favaios, concelho de Alijó, em reportagem. Queria contar a sua história nas
páginas da revista Visão , mas não estava certo de a ter convencido.
Nas nossas conversas prévias, pelo telefone, esta afamada padeira da região
várias vezes me dissera que detestava protagonismos e não desejaria que as
pessoas pensassem que se estava a pôr em bicos de pés.
Creio que a convenci a desfiar as suas recordações, não pelo mediatismo
inevitável das suas memórias, mas à medida que fomos conversando, olhos nos
olhos.
Por causa deste livro, voltei uma, duas, três vezes a Favaios.
Guardo cerca de oito horas de gravações das nossas conversas, fora as
dezenas de páginas com apontamentos.
Liguei-lhe ainda com intervalos de dias, expondo imensas dúvidas,
confrontando-a com leituras, pormenores que descobrira nas obras e
documentos que fazem parte da bibliografia deste livro.
Dela guardo uma amabilidade extrema e um esforço muito acima do razoável
no sentido de compreender o meu obsessivo garimpo na busca das pequenas
histórias que, reveladas, talvez possam dar claridade a zonas menos
frequentadas pela História.
Para um jornalista, Rosália Araújo é um diamante em bruto.
Não só guarda preciosos tesouros das vivências de São Bento nos últimos
anos de vida do antigo Presidente do Conselho, mas sobretudo porque a sua
memória está, no essencial, intacta, e os episódios fluem tal como ela os viveu.
Pormenor importante: Rosália não reconstruiu ou reciclou as suas lembranças
dos anos finais de Salazar a partir das vivências de outros, nem adotou a