Maeve Haran - A Dama do Retrato PT (2013)

(Carla ScalaEjcveS) #1

  • O meu estaleiro é uma bela visão, não é? Foi aqui mesmo que a grande rainha Isabel armou
    cavaleiro sir Francis Drake. – Por um instante, o seu rosto ensombrou-se. – Éramos senhores
    dos mares, no tempo dela. Agora os Holandeses superam-nos. Os barcos deles são mais
    pequenos e lestos do que os nossos, é verdade, e também são mais baratos. E recusam-se a
    saudar a nossa bandeira no mar, como sempre foi costume, reconhecendo a nossa superioridade.
    E agora há uma ânsia por guerra, mas falta-me o apetite brutal que induz os governantes a
    interromper a paz. – Olhou para o mar. – Já vi mortes que cheguem. Que pensa de um rei que
    não deseja fazer a guerra?
    Frances, sensibilizada por ele se interessar pela sua opinião, respondeu com delicadeza:

  • Estou certa de que terá os seus motivos, Majestade.
    Ele riu-se.

  • Tenho. E um deles é o facto de não estarmos preparados, de acordo com o zeloso Mister
    Pepys, meu secretário do Almirantado, que sempre considerei honesto e sábio. Mas esqueçamos
    isto e falemos de coisas mais agradáveis. Veja, ali fica o grande jardim de Mister Evelyn. –
    Apontou para uma bela casa rodeada de canteiros e sebes de azevinho, passadiços de madeira e
    um magnífico jardim oval. – Visitei-o no ano passado e ele mostrou-me os seus projetos, tudo
    plantado durante a lua nova e com o vento a soprar de oeste, como ele julga ser mais propício.
    Planeia escrever um livro no qual anotará tudo isto, para que outros possam segui-lo.
    A visão de Cobham Hall voltou à memória de Frances, que pensava que também essa casa
    poderia ter um jardim como aquele.

  • Acima de tudo, adoraria ter um jardim – declarou com um entusiasmo súbito. – Sim, e uma
    casa com chaminés de tijolo, e torres em ambas as extremidades, rodeada pelo seu próprio
    parque.
    Ele fitou-a de um modo singular, quase como se a visse com novos olhos.

  • Então temos de lhe encontrar um marido.

  • Não tenho grande dote, Majestade – respondeu ela, entrando em pânico. – Para além do que
    receberei por ser aia da rainha. Para além disso, não tenho pressa de me casar.

  • A bolsa real poderia proporcionar-lhe um bom dote. – Segurou-lhe a mão. – Que género de
    marido deseja? – Falava como se ela estivesse a escolher um novo par de luvas perfumadas. –
    Teria de ser generoso, disposto a partilhar tudo o que possuísse.
    Era como se um vento repentino soprasse do rio, forte e gélido. Ela não compreendia como
    ele conseguia ser amável e generoso, cheio de entusiasmo em relação aos seus barcos e
    súbditos, para logo se mostrar tão cínico e calculista. O género de marido que ele queria que ela
    tivesse seria como fora o de Lady Castlemaine – disposto a ser enganado. Ainda que até o pobre
    Roger Palmer se tivesse fartado e, por fim, arrancado a máscara de complacência.

  • Sendo assim, juro por Deus nunca desejaria ter um marido que estivesse preparado para
    tanto.

  • Então que desfrute durante muito tempo do seu estado de solteira, senhora. – Um tom
    ríspido apoderou-se da voz dele, um tom que ela ainda não lhe conhecia. – Até chegar o dia em
    que talvez esteja velha e resignada.

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