- Vamos. Para irmos, não podemos perder tempo, antes que as chamas avancem mais.
O primeiro barqueiro que chamaram mostrou-se relutante em transportá-las para qualquer
sítio perto da doca Three Cranes. - Todos estão assustados, senhoras. Thames Street está cheia de armazéns com alcatrão e pez,
e há madeira e carvão por todo o lado. E a estalagem Star, ali perto, está cheio de feno para os
moços da estrebaria. Levo-vos até onde me parecer que é seguro e mais não, juro pela minha
vida.
Mesmo ali na margem do rio, a quase duas milhas do incêndio, sentiam um estranho cheiro
acre, mais forte ainda do que o habitual fedor londrino. Era um odor penetrante de cinzas
misturadas com resina e terebintina, brandy e pimenta dos armazéns a arder. Ao longe, logo a
seguir à curva do rio, via-se um fulgor, como se um gigante sol vermelho estivesse prestes a
nascer para lá do horizonte. O efeito causado era inquietante, como se um tremendo fenómeno
antinatural estivesse quase a acontecer.
Fizeram toda a travessia em silêncio, observando a aproximação das chamas.
Com o duque de York a seu lado, o rei passou na barcaça real, de feições circunspectas
realçadas pela luz, sem qualquer expressão no rosto, aguardando para ver que novo desastre
tinha ocorrido na capital.
Quando a barcaça se acercou de Queenhithe, ele saltou para as escadas. Um grupo de
moradores já estava a tentar apagar as chamas em Thames Street, ali perto, mas em vão. - Bons homens! – gritou e procurou no bolso uma mão-cheia de soberanos para os encorajar.
Um momento depois, Frances viu que ele próprio se encarregava da organização do combate
ao fogo, chamando soldados para auxiliarem os civis naquela terrível tarefa, com o duque de
York ao comando. Viram-no desaparecer nos estábulos por trás da estalagem Star, para emergir
então na garupa de um belo cavalo branco. O animal empinou-se com o susto ao ver-se rodeado
por tal multidão e pelas labaredas que crepitavam por todo o lado, e parecia ir desatar a
galopar com o monarca de Inglaterra. Porém, quando este lhe disse algumas palavras em voz
baixa, o animal acalmou-se e, a partir de então, mostrou-se indiferente aos gritos de mulheres
apavoradas e ao ribombar de carroças pelas quais passava, carregadas de pertences.
Em Blackfriars, onde Frances e Mary finalmente desceram, o incêndio ainda não grassava de
forma tão drástica. Conseguiram avançar por entre a multidão que se dirigia para o rio e pelos
grupos de homens enegrecidos que passavam os baldes de cabedal e praguejavam por o rio ter
tão pouco caudal, devido ao verão tórrido, e por as bombas de água terem falhado.
Frances reparou que todos os mercadores de Paternoster Row, onde Margaret as enviara em
busca do seu fato de montar, estavam a recolher os bens para os levar. Pratas e ouro estavam a
ser enviados para a Torre e todos os outros produtos valiosos para a nave da catedral de São
Paulo, pois esperava-se que as paredes de pedra e a proteção do Senhor os mantivessem a salvo
aí. - O Mercado Real pegou fogo! – gritou um mercador para outro.
Com tristeza, Frances recordou os vendedores de seda e tecidos delicados nas suas elegantes
galerias, que ela visitara com tanto deleite quando chegara a Londres.
carla scalaejcves
(Carla ScalaEjcveS)
#1