- Desde crianças, Majestade. E esta amizade é muito valiosa para mim. E o que tenho para
lhe dizer poderá pôr em risco essa honra, mas comprometi-me a dizer-lho de qualquer forma. - Pelas chagas de Cristo! Que notícia é essa, tão terrível que possa interpor-se entre amigos
de infância como nós?
Na zona inferior, o teatro continuava buliçoso e ensurdecedor, com os lugares e as galerias
apinhados de cortesãos barulhentos com as suas damas, aprendizes aos gritos e raparigas a
apregoar laranjas. O fedor a suor e urina de galãs demasiado desleixados para se dirigirem às
latrinas erguia-se em vagas, fazendo com que a intrépida Mall desejasse uma lufada de ar
fresco. - Poderemos regressar na carruagem de Vossa Majestade?
Carlos inclinou-se e pegou em Fymm, um dos muitos spaniels que o acompanhavam para todo
o lado, após o que dispersou o rebanho de criados. - Às suas ordens, madame.
Ao entrarem na carruagem real, Mall ficou muda, uma situação tão invulgar como se todos os
pássaros parassem de chilrear antes de alguma catástrofe natural, o que o rei considerou
igualmente de mau agoiro.
Carlos observava-a com curiosidade, recostando o corpo longo e esguio nos estofos tufados. - Terá todo este silêncio e caráter de segredo a ver com o seu casamento e com a profunda
reprovação do seu irmão?
Mall, impressionada por o irmão ainda se preocupar com aquela questão, soltou uma
gargalhada vazia. - Não, diz mais respeito a Vossa Majestade do que a mim mesma. Venho da parte de Mistress
Stuart.
De forma quase impercetível, a postura do rei retesou-se. - Deveras? E que tem Mistress Stuart a transmitir-me que não possa ser ela mesma a fazê-lo?
Mall invocou toda a coragem. Nada havia a ganhar em não ser honesta e direta. - Mistress Stuart roga a Vossa Majestade permissão para aceitar o pedido de casamento do
duque de Richmond e para abandonar a corte.
O rei virou-se como se toda a carruagem tivesse embatido numa lomba acentuada e
inesperada. - O duque de Richmond é um beberrão! Tem o intelecto de um pequeno proprietário e o porte
de um escudeiro campónio!
Mall ignorou aqueles comentários injustos. Dificilmente se poderia esperar que o rei,
obcecado por Frances como estava, enumerasse as virtudes do seu rival. - Não é um galã engenhoso que escreva peças e poesia, como os Lordes Rochester e
Buckhurst, é verdade, mas trata-se de um homem decente e honrado. - E eu não? – Voltou-se para ela, com o rosto lívido de angústia. – Mall, como pode
interceder por ele quando eu próprio lhe supliquei, confiando na nossa amizade, que lhe
mostrasse quanto anseio por ela e preciso de a ter na minha cama? - Eu assim fiz, Majestade. Porém, se a forçar a sucumbir, matará aquilo que ama! É esse o
carla scalaejcves
(Carla ScalaEjcveS)
#1