travessa com carnes que o criado da cozinha acabara de lhes levar.
Frances espreitou pela janela, impaciente, e deparou-se com mais uma bela manhã
primaveril. O sol estava a surgir por entre a neblina do rio e inúmeros barcos pequenos subiam
e desciam pelo caudal, carregados de materiais para a reconstrução da cidade ou transportando
londrinos nos seus afazeres. Os espaços abertos no horizonte calcinado já começavam a ser
preenchidos com novos edifícios que ocupavam o que o fogo havia dizimado.
- Porque não envia ao menos a Mary com alguma notícia? – exigia Frances, andando de um
lado para o outro, demasiado ansiosa para se dedicar às tarefas habituais. - Talvez receba novidades ainda hoje. Agora venha para aqui e ajude-me a escolher o vestido
que hei de usar para ir ao teatro logo à noite. O azul ou o âmbar?
Mall mostrava-lhe os dois. - O azul. Não, o âmbar. Eu não sei! O que lhe ficar melhor!
- Mas que resposta tão útil. Quase me dá vontade de desejar que o seu pretendente tivesse
mudado de ideias.
Lamentou de imediato tais palavras, ao ver o efeito que surtiam em Frances. - Pensa realmente que isso tenha acontecido?
Mall abanou a cabeça. Não deu voz ao único receio que tinha, que era o de que o duque,
reconhecidamente com escassez de fundos, não conseguisse reunir as garantias necessárias para
o acordo. Ela própria vivera em Cobham Hall e sabia como era ruinosamente dispendiosa a
manutenção de uma casa grande.
Três dias depois de Frances ter enviado a sua mensagem, estavam elas a percorrer o relvado
de boliche, maravilhadas com a forma como o rei conseguia tratar dos seus deveres e discutir
assuntos de estado enquanto jogava, quando a conversa entre o grande grupo de cortesãos
reunido se interrompeu de repente.
Uma figura alta, com um familiar cabelo arruivado, formalmente vestido com um casaco de
veludo azul e as penas do chapéu a agitarem-se com a brisa, avançou por entre a multidão em
direção ao rei. Fez uma vénia profunda e ofereceu ao soberano um pergaminho enrolado com
uma fita cor de vinho. - Vossa Majestade – anunciou o duque –, eis as garantias financeiras que me requereu.
- Não vê Vossa Senhoria – inquiriu o rei num tom descontraído –, que estou mais preocupado
com uma partida de boliche do que com a questão sem dúvida urgente das suas núpcias? Pode
entregar a informação ao Lorde chanceler que, quando tiver oportunidade de descansar dos
assuntos de estado, decerto a lerá e apresentará os seus comentários.
O duque percebeu que tinha sido dispensado. Descreveu uma vénia formal e retirou-se.
Ao afastar-se, a voz de Lorde Rochester fez-se ouvir: - Já é meio-dia e ele não está bêbado. É certamente um milagre que teremos de atribuir ao
amor.
O rei riu-se bem alto e Frances viu que o duque levava a mão à espada embainhada. - Realmente, senhor – ripostou o duque, num tom melífluo e perigoso –, do que ouço dizer de
si, já acorda embriagado.