outros muçulmanos o máximo possível. Tentava até disfarçar seu nome árabe. Em seu
último trabalho, uma pequena empresa de consultoria em TI, era conhecido apenas
como Q, ou Q-Ban, do que gostava, porque lembrava vagamente um nome hispânico e
o hip-hop. Ele não era um desses muçulmanos com a cara no chão e a bunda no ar,
dizia, com um leve sotaque, aos colegas enquanto tomavam cerveja. Viera aos Estados
Unidos porque queria escapar de tudo aquilo. Sim, sua mulher usava hijab, mas tinha
mais a ver com tradição e moda do que com fé. E, sim, ele tinha batizado seu filho de
Mohamed, mas não tinha nada a ver com o profeta. Isto, pelo menos, era verdade.
Qassam el-Banna batizara seu filho em homenagem a Mohamed Atta, líder operacional
do 11 de Setembro. Atta, como Qassam, era um filho do Delta do Nilo. Não era a única
característica que tinham em comum.
Terminadas as orações, Qassam se levantou e desceu em silêncio para a cozinha,
onde colocou uma cápsula de café francês na máquina Keurig. Então, na sala, fez
duzentas flexões e quinhentos abdominais. Treinar duas vezes por dia tinha remodelado
seu corpo. Ele já não era o garoto magrelo do Delta; tinha o corpo de um lutador de
UFC. Além dos exercícios, tinha se tornado mestre de caratê e jiu-jítsu. Qassam el-
Banna, Q-Ban, era uma máquina mortífera.
Ele terminou o treino com alguns movimentos letais de cada disciplina e subiu
novamente. Amina ainda estava dormindo, assim como Mohamed. Qassam usava o
terceiro quarto do pequeno duplex como escritório. Era o paraíso de um hacker. Ele
entrou, sentou-se em frente a um dos três computadores e rapidamente navegou por
dezenas de contas de e-mails e páginas em redes sociais. Mais alguns toques o levaram
até uma porta de entrada da dark net, o mundo sombrio da internet escondido embaixo da
superfície da web, acessado apenas se o usuário tiver o protocolo, as senhas e os
aplicativos e softwares adequados. Qassam, profissional de TI, tinha tudo de que
precisava — e mais.
Qassam atravessou o portal rapidamente e logo se viu diante de outro. A senha
correta deu acesso a ele, uma linha de texto desejou paz e perguntou o que ele queria. Ele
digitou a resposta na caixa designada e, após um breve intervalo, recebeu uma mensagem
de espera.
— Alhamdulillah — disse ele, em voz baixa.
Seu coração batia rápido — mais rápido que durante seu treino rigoroso. Duas
vezes, ele tentou redigitar a senha, mas a pressa o fez digitar errado. No início, a
mensagem parecia um monte de caracteres embaralhados — linhas, letras e números sem
propósito aparente —, mas a senha correta imediatamente transformou a bagunça em um
texto claro. Qassam o leu lentamente, pois a mensagem não podia ser impressa, salva,
copiada nem recuperada. As palavras em si também eram codificadas, mas ele sabia
exatamente o que queriam dizer. Alá finalmente o colocara no caminho da grandiosidade.
E, com ela, pensou, viria a imortalidade.
carla scalaejcves
(Carla ScalaEjcveS)
#1