ANJO CAÍDO

(Carla ScalaEjcveS) #1

— Não foi — admitiu Donati.
— A melhor maneira de colocar Sua Santidade em perigo é me posicionando ao lado
dele.
— Pense a respeito.
Donati levou outra colherada de consomê aos lábios e, pensativo, assoprou — o que
era estranho, pensou Gabriel, pois sua própria sopa já estava morna.
— Tem algo mais em mente, Luigi?
— Ouvi rumores de que você visitou a Villa Giulia ontem.
— O lugar tem objetos lindos.
— Parece que sim. — Donati acrescentou em voz mais baixa: — Você deveria ter me
dito que ia vê-la.
— Não me dei conta de que precisava de sua permissão.
— Não foi o que eu quis dizer.
— Quando aceitei o caso, você me garantiu que todas as portas estariam abertas.
— Não as portas para o meu passado — respondeu Donati, calmo.
— E se o seu passado tiver algo a ver com a morte de Claudia?
— Meu passado não tem nada a ver com a morte dela.
As palavras do monsenhor foram ditas num tom quase litúrgico. Faltaram apenas o
sinal da cruz e o amém.
— Você gostaria de um pouco mais de sopa? — perguntou ele, tentando aliviar um
pouco a tensão do momento.
— Vou resistir — respondeu Gabriel.
Duas freiras entraram e recolheram os pratos. Elas retornaram logo em seguida com o
prato principal: uma fatia fina de vitela, batatas cozidas e vagens com azeite. Donati
aproveitou a interrupção para recompor seus pensamentos.
— Eu pedi sua ajuda — falou ele — porque desejava que esse inquérito fosse
conduzido com certa discrição. Agora o general Ferrari e os Carabinieri estão envolvidos,
exatamente o que procurei evitar.
— Eles estão envolvidos porque meu inquérito me levou a um tombarolo morto
chamado Roberto Falcone.
— Eu sei disso.
— Você preferiria se eu tivesse fugido?
— Eu preferiria — respondeu Donati, depois de pensar um pouco — que essa bagunça
não fosse cair no colo das autoridades italianas, que nem sempre têm em mente o melhor para
a Santa Sé.
— Esse teria sido o resultado independentemente do que eu fizesse.
— Por quê?
— Porque o general não teria levado muito tempo para ligar Falcone a Claudia por
meio dos registros telefônicos. E a próxima parada teria sido Verônica. A menos que estivesse
preparada para mentir em seu nome, ela teria dito ao general que, após a morte de Claudia,
você lhe pediu para ficar em silêncio. E então Ferrari teria batido na porta do Palácio
Apostólico com um mandato nas mãos.

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