pessoas a apedrejar as janelas e, porque não, a ensaiar uma invasão.
Soldados do COPLAD, o Comando Operacional de Luanda, enquadravam a
manifestação armados com espingardas automáticas G-3 . Um mar de gente
espraiava-se pela larga avenida. Patrício viu dois miúdos exaltados, um
bastante alto que erguia a mão com o punho fechado e outro bem mais
pequeno que o acompanhava. Os dois, muito agitados, acercavam-se
agressivamente dos soldados. Patrício percebeu o que os jovens faziam ali, na
primeira linha da manifestação, junto aos militares que, não obstante,
procuravam mostrar-se imunes às provocações. Havia também alguns
estudantes portugueses, poucos, contagiados pelo espírito revolucionário.
Fruta da época, sorriu Patrício, encarando com desprezo aqueles burguesinhos
ingénuos que vinham para a rua virar-se contra os seus. Não gostava deles,
mas reconhecia que eram uns idiotas úteis.
Notou que a manifestação começava a subir de tom, a ganhar intensidade
com o troar impressionante de milhares de vozes simultâneas. O povo irado,
exausto, gritava o seu desespero. Pusera-se um sol tremendo, sem nuvens,
capaz de secar a alma e alterar o juízo, e, com o espaço a minguar, as pessoas
muito apertadas, incomodadas, a sentirem a roupa suada a colar-se ao corpo,
tornavam-se mais irritáveis, mais susceptíveis aos estímulos negativos. Os
miúdos acossavam a tropa. Os estudantes também. Um em particular, de
cabelo ruivo encaracolado, parecia possuído, como se quisesse bater nos
soldados. Um pelotão de pára-quedistas chegou em formação por uma rua
lateral, a marchar no passo de corrida das urgências operacionais. Mais
cinquenta espingardas. Patrício viu os reforços tomarem posições. E viu o
estudante mais nervoso a acercar-se de um soldado próximo e a cuspir-lhe
insultos, cara a cara, a salpicar perdigotos para o seu rosto enervado. O
estudante estava a pisar o risco. Não tem noção do perigo que corre,
espantou-se Patrício. Perguntou-se se seria coragem ou pura estupidez. O
soldado, intimidado, enxotou o rapaz. Ele próprio tinha um ar muito jovem e
o dedo a tremer no gatilho. Olhou para trás, para o camarada que lhe dava
cobertura. O outro, mais tranquilo, mais frio, fez-lhe um sinal de cabeça, vem
para ao pé de mim, e ele recuou. Ficaram lado a lado, a vigiar a turba. O
estudante foi agarrado por um colega, pela cintura, e arrastado para trás, mas
dobrava-se para a frente a espumar de raiva, literalmente, a espernear, num
histerismo descontrolado, provocando a desordem na cabeça da manifestação.
Esgatanhava-se todo para se libertar, disposto sabia-se lá a quê. Nas suas