— Não percas tempo. Traz o miúdo e não penses em mais nada. Tudo o que
precisares, eu estarei aqui para te ajudar. Descansa, que não te vai faltar nada.
Percebeste?
— Percebi, pai.
— Trata de te pôr a salvo com o teu filho, que eu trato do resto.
— Vou fazer isso, pai. Obrigada — disse Regina, segurando mal a voz
tremida, à beira das lágrimas. — Obrigada pelo seu apoio.
— És minha filha — lembrou-lhe ele, no seu jeito categórico — e é minha
obrigação, e meu desejo, apoiar-te e proteger-te de todos os males, de todas as
formas ao meu alcance. E o mesmo se aplica ao meu neto.
Desligou, muito comovida, com a alma por um fio, e depois deixou-se
embalar num pranto redentor. Deitou tudo cá para fora, a tensão, o medo, a
tristeza... chorou por não aguentar mais, por não conseguir continuar a
reprimir as emoções, chorou para descomprimir, e chorou de alívio,
agradecida pelo inesperado apoio do pai, a pensar que, pelo menos, agora
poderia regressar a Lisboa sem sentir o peso do mundo inteiro sobre os seus
ombros, pois não teria de passar sozinha por todas as dificuldades que a
esperavam.
Aguardou, impaciente, pela saída das malas. Esperou quase trinta minutos
até as poder recolher. Colocou-as num carrinho e dirigiu-se para a porta com
o filho pela mão. Tinha a família inteira à espera dela, mas o primeiro a
abraçá-la foi o pai. Este, numa rara transigência sentimental, afastou a filha à
medida dos braços estendidos, com uns dedos vacilantes cravados nos ombros
dela, e encarou-a com os olhos brilhantes e rasos de emoção. Deixa-me ver-te,
disse, voltando a puxá-la para o seu peito, envolvendo-a num longo e forte
abraço que, todavia, nunca poderia colmatar as saudades agravadas pelo
equívoco do conflito que os separara mesmo antes dela ter partido para
Luanda e que ficara sem uma solução satisfatória durante aqueles anos todos.
— Eu sempre gostei de ti, minha filha — segredou-lhe ele ao ouvido, com
uma voz trémula que ela nunca lhe ouvira.
— Eu sei, pai — procurou descansá-lo. — Eu sei.
A impaciência da mãe e da irmã, sequiosas de um beijo, de uma atenção,
acabou por apartá-los, embora não passasse despercebido a Regina o esforço
sincero do pai para selar ali mesmo a reconciliação que iniciara dias antes ao
telefone. Achou a atitude dele admirável, um prenúncio positivo que tanta