— A merda do vosso plano — comentou Nuno, sem fazer cerimónia — não
é lá muito favorável aos portugueses, pois não? Olha os teus pais, a partirem
desta maneira, olha os portugueses todos, que vão deixar cá tudo o que têm.
Vocês querem entregar Angola ao MPLA, é esse o vosso plano? As eleições
que se lixem? Os portugueses que se fodam? Por mim, tudo bem, acho tudo
um nojo, mas não me meto em política.
— Não é isso que eu tenho ouvido — disse Antero, passando ao lado do
achincalho.
— Não?
— Não. O que eu tenho ouvido falar é de uns transportes aéreos de armas
para a UNITA.
— A sério? — escarneceu Nuno. — Isso é uma grande porra. Não me digas
que achas que a situação ainda pode virar e lixar os teus amigos comunas.
Deixa lá, que eles são todos iguais.
— Se são todos iguais — contra-atacou Antero — o que é que te interessa
se o MPLA fica no poder?
— Não me interessa, já te disse, estou-me nas tintas. Só me chateia que
vocês apoiem a política de terror contra os portugueses, para deixarem tudo
ao MPLA.
— Não é nada disso que nós fazemos! — encrespou-se Antero, numa
exclamação indignada. Nuno levantou uma sobrancelha surpreendida.
— Ah, não?
— Não, porra, claro que não.
— Pá, desculpa lá, é o que parece — respondeu Nuno, no mesmo tom
sarcástico.
— Isso são bocas da reacção — replicou Antero, seco, recorrendo ao
chavão revolucionário da moda para sacudir qualquer migalha de traição de
cima do seu uniforme.
— Se tu o dizes.
— Porra, Nuno, pára lá com essa conversa de facho.
Nuno olhou para ele espantado e soltou uma gargalhada curta.
— Facho, eu? Não te disse já que não quero saber de política?
— Disseste — concordou Antero, contemporizador. — Por isso mesmo,