com a mulher, a ajudá-la no dia-a-dia com o filho, mas também não andava
exactamente na borga. E não seria o primeiro pai de família com uma
profissão que o obrigasse a viajar constantemente. Portanto, o assunto nunca o
incomodara demasiado, nunca fora uma questão que o fizesse sentir-se
culpado, embora, ocasionalmente, tivesse criado uma certa tensão entre eles.
Nuno achava que Regina compreendia a sua necessidade de voar, a sua total
incapacidade para se dedicar a um trabalho confinado a quatro paredes.
Precisava de viver com emoção e em liberdade plena. Era isso que o avião lhe
oferecia. Evidentemente, uma coisa era ela compreender, outra era aceitar de
cara alegre as ausências de Nuno, dias a fio, ao longo de anos. De facto, tinha
havido alturas em que os momentos de tensão haviam-nos levado muito perto
da separação. Mas Regina recuara sempre no último instante e Nuno, que a
conhecia bem, sabia que não fora por falta de coragem mas por verdadeiro
amor.
Fosse como fosse, tinham sobrevivido a todas as provações e Nuno sentia
que seria bom para ambos terem uma relação mais normal. O seu feitio
pragmático levava-o a encarar as condicionantes da vida com uma certa
naturalidade, sem dramatismos excessivos, e a procurar com optimismo o
lado bom das circunstâncias. Para ele, Angola estava prestes a tornar-se um
capítulo encerrado, um ponto final de um período muito feliz que valera a
pena viver. Em breve partiria definitivamente e não tencionava perder um
minuto que fosse a lamentar-se ou a ponderar como teria sido se não tivesse
sido assim, se tivesse continuado tudo igual em Luanda. Não ficaria a remoer
o passado, não se deixaria consumir por rancores inúteis. Não era o seu
género baixar os braços e cair em depressões por causa das injustiças do
mundo. Nuno sabia desde pequeno que o mundo não era justo, era um facto
iniludível e ele aceitava-o, considerava que valia mais a pena seguir a
corrente, adaptar-se, do que remar contra a maré. Procurava aproveitar ao
máximo o que a vida lhe oferecia, sem se envolver demasiado em coisa
nenhuma, e depois então continuar o seu caminho. Tal como dissera a Antero,
achava aquilo tudo um nojo, mas era só a sua opinião e não significava que
tivesse o mais leve espírito de voluntarismo para se empenhar nalguma
cruzada para contrariar o curso dos acontecimentos. Na hora de entregar
Angola, os responsáveis portugueses deixariam o país, o povo, entregue à
maior tragédia da sua história, sem dúvida, mas isso não era um problema
dele. Chamassem-lhe oportunista, mas, como também dissera ao capitão
Antero, só queria ganhar o seu. Não levava armas à UNITA para ajudar o
movimento a cumprir a sua obsessão pelo poder, mas tão-só para receber em