fardados de preto, formavam uma parede humana e, definitivamente, não
tinham cara de quem vinha para uma conversa agradável. Nuno estacou.
— Onde é que o camarada vai? — perguntou o homem que comandava
aquela pequena força das FAPLA.
Olhou para o tipo, desconcertado, sem saber se devia ser humilde, se
arrogante. Decidiu-se pela segunda hipótese.
— Onde eu vou — disse — é um problema meu.
O soldado mais próximo nem esperou pela ordem para lhe enfiar a biqueira
da bota da tropa pelo estômago adentro. Foi um daqueles pontapés
extraordinários, de tirar o ar e fazer vomitar as tripas de um só fôlego. Nuno
dobrou-se agarrado à barriga, a tentar desesperadamente respirar, caiu para a
frente de joelhos, sem forças nas pernas. Acto contínuo, o soldado deu-lhe
com a coronha da Kalashnikov em cheio na nuca e Nuno espalhou-se de cara
no passeio. O seu nariz fez um barulho estranho ao partir-se contra o cimento
e jorrou sangue. O seu cérebro apagou-se ao embater no chão e já não ouviu o
clic-clac da Kalash a ser engatilhada.
— Mato o pula? — perguntou o soldado.
— Aqui não — respondeu o comandante. — Vamos levá-lo.
Os soldados pegaram nele pelos braços e arrastaram-no desmaiado, sem
gentileza, de cabeça à banda, rosto ensanguentado, até ao jipe. Atiraram-no de
qualquer maneira para o banco de trás, saltaram para dentro e arrancaram.
Depois disto, Nuno foi dado como desaparecido, um dos inúmeros
desaparecidos naquela época em Luanda.