Um Homem Escandaloso

(Carla ScalaEjcveS) #1

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Uma semana não chegava para conhecer os paraísos do Rio de Janeiro, mas o entusiasmo de
Cristiane ao mostrar a cidade a João Pedro era transbordante. Logo ela, que fora visitando sozinha
todos os cantinhos maravilhosos nas inúmeras viagens que lá fizera. Normalmente escolhia um ou
dois locais de interesse, não mais, porque sabia que iria voltar e não queria esgotar as possibilidades
de explorar os encantos do Rio. Mas era um prazer que fazia questão de guardar para si, nunca tivera
a menor vontade de se deixar acompanhar nos seus passeios turísticos pela cidade e, se acontecia ter
uma relação esporádica com algum colega que a entusiasmasse, ficava-se quase sempre pelas
alternativas mais frívolas: as praias, os restaurantes, as discotecas. Os lugares encantadores
pareciam-lhe territórios sagrados que não se permitia partilhar, onde gostava de ir só com a sua
máquina fotográfica, os seus pensamentos elevados, os seus sonhos intransmissíveis.
A novidade era, portanto, este desejo extemporâneo de levar João Pedro a todos os sítios onde já
estivera e chamar-lhe a atenção para os pormenores e tirar-lhe fotografias ou pedir a um turista
ocasional para lhes tirar uma fotografia. Subiram ao Pão de Açúcar e ao Cristo Redentor, no morro
do Corcovado, onde apreciaram, reverentes, as vistas largas; deram um abraço apaixonado na
intimidade de um teleférico, abismados com o milagre do pôr-do-sol; passearam de mãos dadas
pelos verdes opulentos do Jardim Botânico, por entre as palmeiras imperiais que subiam até ao céu,
e descobriram os seus segredos, as estátuas da dança das mulheres nuas, os exóticos macacos Prego,
a ponte vermelha do jardim japonês. Foram numa excursão à surpreendente favela de Santa Marta, no
Botafogo, pacificada e renovada de cores berrantes; deliciaram-se com a areia fina das praias, de
Copacabana a São Conrado.
Num desses dias cheios, almoçaram na esplanada da piscina que confinava com o campo de golfe
no exclusivíssimo Clube da Gávea, onde só entraram por convite de um sócio amigo de Cristiane —
os contactos influentes de Cristiane pareciam ser ilimitados — e ali ficaram algumas horas em paz,
hipnotizados pela beleza transcendente das montanhas circundantes, a ver os praticantes de asa delta
que saltavam do alto da Pedra Bonita e iam a planar sobre a densa mata atlântica até à praia.


— Esta cidade é o lugar mais próximo do paraíso que eu conheço — comentou Cristiane.
— Apetecia-me pintar estes morros — disse João Pedro, emocionado com as cores vivas das
montanhas de um verde carregado, recortadas pelo azul do céu.
— Queres mudar-te para cá? — perguntou ela, inspirada na contemplação daquela perfeição
natural que os esmagava, e pela terceira caipirinha bebida como se fosse um inocente granizado.
— Quero, quero um apartamento espaçoso com vista para o mar.
— E piscina no topo.
— Evidentemente.
— Pedes-me em casamento?

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